Costura de tempos - Os elos silentes da biblioteca de Etienne Samain

Data da publicação: qua, 04/05/2022 - 11h35min

A Biblioteca Octávio Ianni do IFCH Unicamp retomará o calendário de exposições de 2022 com a mostra Costura de tempos - Os elos silentes da biblioteca de Etienne Samain, com abertura dia 14 de março. Trata-se da retomada da exposição que estava originalmente prevista para ser realizada no início de 2020 mas foi interrompida junto com o fechamento da Biblioteca.

A exposição contará com parte do acervo com cerca de 2.400 volumes que foi doada pelo professor aposentado Etienne Samain para Biblioteca Octávio Ianni. Os títulos doados pelo professor tratam de temas ligados à antropologia, artes visuais e religião, entre outros assuntos.

A curadoria é de Fabiana Bruno, que fará uma visita guiada durante a inauguração. A exposição fica em cartaz até o dia 20 de abril de 2022.

Entrevista com Etienne Samain: "Depósito, deste modo, minha confiança e meu reconhecimento nas mãos desses estudantes e pesquisadores de amanhã". 

1) Porque a sua decisão em doar o seu acervo para a Biblioteca Octávio Ianni do IFCH Unicamp? 

Penso que, chegando numa certa idade, importa saber preparar discretamente sua saída e, para tanto, saber se desfazer e doar o que a gente ama. E, veja, uma biblioteca que se constrói ao longo de boa parte de uma vida, é uma memória viva que não se pode de repente abandonar. Deve viajar e respirar novamente. É necessário confiá-la.

Acrescentaria isso: minha biblioteca é, também, uma pequena família de parentesco múltiplo. Ela se junta agora à biblioteca Octávio Ianni, a uma família muito maior de livros e, sobretudo, de pesquisadores, que nos precederam e que nos formaram. Estou muito feliz.

2) Grande parte do acervo são ligados às áreas de Antropologia, Antropologia Visual, Artes Visuais e Antropologia e Exegese Bíblica. Como foi a formação desse acervo ao longo de sua vida, tanto pessoal quanto acadêmica?

É verdade, da exegese bíblica - na qual me formei num doutorado em Lovaina - até as artes visuais onde cheguei, passando dos mitos bíblicos aos mitos indígenas, da antropologia social à antropologia visual, existe todo um caminho, um percurso que se articula e, que, aliás, procurei traçar para os visitantes da exposição que vai se apresentar sob a figura de uma “Grande Mesa de trabalho”.

Não sou um colecionador de livros. Foram os livros que chegaram ao encontro dos meus questionamentos e dos questionamentos dos estudantes que me acompanharam durante um quarto de século. Tanto os livros como os textos que produzi são, dessa maneira, campos de estudo que, partindo da exegese bíblica, me foram fornecidos - sucessivamente e numa complementaridade necessária – primeiro, pela Antropologia, depois, pelos questionamentos oriundos da Comunicação humana e, finalmente, através de uma imersão imperativa, no mundo das Artes.

Vejo, então, esses livros, essa produção acadêmica como um tecido comprido que, lentamente, se desenrola e cuja trama vai gradualmente se enriquecendo pelo entrelaçamento de vários e múltiplos fios. Alguns deles são fios vermelhos e eu os nomeio: Roland Barthes, Claude Lévi-Strauss, Jack Goody, Anne-Marie Christin, Bronislaw Malinowski, Gregory Bateson, Margaret Mead, Aby Warburg, Georges Didi-Huberman, Hans Belting, Alfred Gell.

Acredito que na minha vida fui sempre um mensageiro de saberes que outros – índios e pesquisadores - me confiaram.

3) Qual a importância que esse acervo poderá ter na formação de novos estudantes e pesquisadores do instituto ligados à essas áreas?

Não posso responder à essa questão já que nem posso conhecer os futuros do meu próprio destino. Posso apenas retomar o que dizia Bateson no final de sua vida:

“Não sou daqueles que mergulham no seu trabalho sem esperar nenhum reconhecimento, sucesso ou aprovação vinda de fora; sempre precisei saber que os outros acreditam no meu trabalho, em seu sentido e em seu futuro. Mas em contrapartida, fiquei muitas vezes impressionado com a confiança que pessoas depositavam em mim quando eu mesmo tinha tão pouca. Vez ou outra, tentei me livrar da responsabilidade que esta confiança total fazia pesar sobre mim. E dizia a mim mesmo: ‘Afinal, não sabem nada do que eu faço. Como poderiam eles saber o que eu mesmo ignoro’?”

Depósito, deste modo, minha confiança e meu reconhecimento nas mãos desses estudantes e pesquisadores de amanhã. Tecerão outros futuros.

( * ) As fotografias inseridas nesta entrevista foram retiradas de dois vídeos, especialmente produzidos por Françoise Biernaux para esta exposição: Quando os livros viajam (11 min.) e Monsieur Etienne. Histórias sem história (3 min.).

Saiba mais sobre a doação do acervo na matéria Etienne Samain doa coleção particular de livros para a Unicamp publicada no Portal da Unicamp.

Lista completa dos livros já catalogados pela biblioteca, os quais estão disponíveis para consulta local ou empréstimo. 

Lista dos livros que fazem parte da exposição da Biblioteca.

Textos [PDF] dos artigos (1985-2018) de Etienne Samain no sítio eletrônico da UFPB (CCHLA)

Clique aqui para acessar o texto Anamnese de um percurso acadêmico (versão expositiva). 

Clique aqui para acessar o texto Anamnese de um percurso acadêmico (versão completa). 


Programação:

Data Título Local
qua, 04/03/2020 - 14:00 Costura de tempos - Os elos silentes da biblioteca de Etienne Samain Biblioteca Octávio Ianni do IFCH