Chamada pública para seleção de uma bolsa de Treinamento Técnico nível 3 (TT3) para participar no projeto Projeto: Energia limpa, vida sustentável

Data da publicação: qua, 20/03/2024 - 17h54min

Chamada pública para seleção de uma bolsa de Treinamento Técnico nível 3 (TT3) para participar no projeto Projeto: Energia limpa, vida sustentável: fomento à educação escolar, à transmissão de práticas tradicionais e à geração de renda entre os povos indígenas do Baixo Oiapoque e Mapuera-Trombetas-Nhamundá (Calha Norte), vinculado à Chamada Iniciativa Amazônia +10, FAPESP (organizada pelo Conselho Nacional de Fundações de Amparo à Pesquisa Estaduais – CONFAP).

 

DA APRESENTAÇÃO DO PROJETO

O projeto Energia limpa, vida sustentável é um projeto colaborativo que responde ao Edital Amazônia +10 e envolve equipes de pesquisadores da Unicamp, Unifap e UFOPA. Este projeto se coloca a seguinte pergunta: de que forma a energia elétrica limpa pode impactar a vida de populações indígenas? Por meio dessa questão norteadora, o projeto será́ desenvolvido em duas regiões distintas da Amazônia Brasileira: a região do baixo rio Oiapoque, no estado do Amapá́, que comporta as Terras Indígenas Uaçá, Juminã e Galibi; e a região da Calha Norte, especificamente as áreas referentes às Terras Indígenas do Trombetas-Mapuera e Nhamundá-Trombetas. O projeto tem como problema central as precariedades relativas ao acesso à energia limpa, as quais dificultam o cotidiano das populações indígenas destas regiões, limitando as possibilidades de produção de recursos para o acesso a bens que estão, há tempos, incorporados à vida nas aldeias. Tendo a energia elétrica como fundamento, a proposta aborda a questão da geração de renda com foco na produção de artefatos (cestaria, cerâmica, trabalhos com miçanga e sementes, cuias, entre outros) tanto para uso dentro das comunidades como para sua venda. Acrescente-se que, o implemento da energia elétrica é aqui entendido como um subsídio fundamental para uma produção econômica que associe saberes tradicionais à educação escolar formal e à agregação de valor aos objetos comercializados. Em suma, este projeto se estrutura num tripé́ constituído por: 1) geração de energia elétrica sustentável; 2) fomento a cadeias produtivas de artefatos; e 3) relação entre o conhecimento indígena e não indígena. Por fim, o projeto foi concebido a partir da demanda dos povos indígenas das regiões aqui contempladas e se estrutura de forma interdisciplinar e colaborativa.

 

DA BOLSA E VAGA

2.1. Será ofertada uma (01) bolsa Fapesp de Treinamento Técnico - 3 (TT-3), no valor de R$ R$ R$ 1.507,60 (mil quinhentos e sete reais e sessenta centavos) mensais, pelo período de maio de 2024 a abril de 2026.

2.2. Para a vaga desta chamada será criado o cadastro reserva de 1 (um/a) candidato(a).

2.3. A vigência da bolsa será de até 24 meses.

 

DO/A BOLSISTA

3.1 Requisitos dos/as candidatos/as:

3.1.1. Ser graduado do nível superior, sem reprovações em seu histórico escolar, com dedicação de 40 horas semanais às atividades de apoio ao projeto de pesquisa. O tempo de bolsa TT-3 será descontado no caso do interessado vir a usufruir de Bolsa de Mestrado ou Doutorado Direto. 

3.1.2. Possuir conhecimento em pacotes office ou similares e familiaridade com banco de dados.

3.1.3. Possuir interesse em pesquisas colaborativas com populações indígenas.

3.1.4. Não possuir vínculo empregatício, nem receber salário fixo, inclusive estágio remunerado, durante a vigência da bolsa.

3.1.5. Não acumular bolsas de qualquer natureza.

 

DAS ATRIBUIÇÕES DO/A BOLSISTA

4.1. Cabe ao/à bolsista selecionado/a cumprir 40hs semanais, em horário a ser acordado conjuntamente com a professora coordenadora do projeto.

4.2. Ao/À bolsista cabe auxiliar os e as pesquisadores/as nos trabalhos de planejamento, organização e execução das atividades relativas do projeto.

4.3. Estar em contato com as equipes de pesquisa de Campinas (SP), Calha Norte (PA) e Oiapoque (AP) e membros dos coletivos e comunidades, sempre que houver demanda.

4.4. Participar da elaboração de relatórios, prestação de contas e outras produções resultantes do projeto

4.5. Cabe ao/à bolsista participar dos debates e reuniões de pesquisa

4.6. Ao/À bolsista cabe a elaboração de fichas e resenhas do material de pesquisa e de estudo

4.7. Cabe ao/à bolsista contribuir com a divulgação do projeto e seus resultados

 

DAS INSCRIÇÕES E SELEÇÃO

5.1 Os candidatos deverão enviar a documentação abaixo relacionada para o endereço eletrônico artionka@unicamp.br (com cópia para elisbarros@unifap.br e lilian.rebellato@gmail.com), indicando “Processo seletivo TT3: energia limpa, vida sustentável” no assunto. Cada documento deve ser anexado individualmente em formato PDF e tendo por título o nome da/o candidata/o, seguido do tipo de documento. Ex. “João Maria da Silva - Certificado de conclusão da graduação”. No corpo do e-mail deverá ser informado: nome completo, endereço e número de telefone para contato.

5.2 Período de inscrições por e-mail: 20/03/2024 a 04/04/2024 até 23h59;

5.3 No ato da inscrição (por e-mail), o candidato deverá encaminhar as seguintes

informações e documentos:

a) Dados de identificação do/a candidato/a: Nome completo; CPF; Curso Concluído; E-mail; Telefone.

b) Histórico da graduação;

c) Carta de Apresentação de até três (3) laudas do/a candidato/a (em PDF) explicitando seu interesse, as qualificações para função e experiências anteriores, se houver.

5.4 A homologação das inscrições depende do envio de todos as informações e

documentos exigidos, conforme descrito no item 5.3 a, b e c.

5.5 A relação dos candidatos homologados será informada no dia 05/04/2024 por e-mail para todos e todas os/as candidatos/as inscritos/as, com o horário das entrevistas a serem realizadas no dia 08/04/2024, online.

5.6. O resultado da seleção será divulgado até o dia 12/04/2024, por e-mail, para todos os candidatos.

 

Projeto: Energia limpa, vida sustentável: fomento à educação escolar, à transmissão de práticas tradicionais e à geração de renda entre os povos indígenas do Baixo Oiapoque e Mapuera-Trombetas-Nhamundá (Calha Norte)

Project: Green energy, sustainable life: boosting school education, transmission of traditional practices, and income generation among the indigenous peoples of the Lower Oiapoque and Mapuera-Trombetas-Nhamundá rivers (Calha Norte)

Pesquisador Responsável

Instituição de Ensino e Pesquisa ou Empresa  E-mailTelefone

Fundação de Amparo à Pesquisa acionada para financiamento

Artionka Manuela Góes Capiberibe

Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

artionka@unicamp.br

(11)986912151

FAPESP

Lilian Rebellato

Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa)

lilian.rebellato@ufopa.edu.br

(93)992069856

FAPESPA

Elissandra Barros da Silva


 

Universidade Federal do Amapá (Unifap)

elisbarros@unifap.br

(96)981234432

FAPEAP

 

Duração do Projeto: 36 meses

Resumo:

Este projeto se coloca a seguinte pergunta: de que forma a energia elétrica limpa pode impactar a vida de populações indígenas? Por meio dessa questão norteadora, o projeto será desenvolvido em duas regiões distintas da Amazônia Brasileira: a região do baixo rio Oiapoque, no estado do Amapá, que comporta as Terras Indígenas Uaçá, Juminã e Galibi; e a região da Calha Norte, especificamente as áreas referentes às Terras Indígenas do Trombetas-Mapuera e Nhamundá-Trombetas. O projeto tem como problema central as precariedades relativas ao acesso à energia limpa, as quais dificultam o cotidiano das populações indígenas destas regiões, limitando as possibilidades de produção de recursos para o acesso a bens que estão, há tempos, incorporados à vida nas aldeias. Tendo a energia elétrica como fundamento, a proposta abordará a questão da geração de renda com foco na produção de artefatos (cestaria, cerâmica, trabalhos com miçanga e sementes, entre outros) tanto para uso dentro das comunidades como para sua venda. Acrescente-se que, o implemento da energia elétrica é aqui entendido como um subsídio fundamental para uma produção econômica que associe saberes tradicionais à educação escolar formal e à agregação de valor aos objetos comercializados. Em suma, este projeto se estrutura num tripé constituído por: 1) geração de energia elétrica sustentável; 2) fomento a cadeias produtivas de artefatos; e 3) relação entre o conhecimento indígena e não indígena. Por fim, o projeto foi concebido a partir da demanda dos povos indígenas das regiões aqui contempladas e se estrutura de forma interdisciplinar e colaborativa.

Palavras-chave: Amazônia, Povos Indígenas, baixo rio Oiapoque, Trombetas-Mapuera- Nhamundá, Energia fotovoltaica, Artefatos, Sustentabilidade e geração de renda.

 

Enunciado do problema:

Este projeto se coloca, de partida, a seguinte pergunta: de que forma a energia elétrica limpa pode impactar a vida de populações indígenas? Com essa questão norteadora, esta proposta será desenvolvida em duas regiões distintas da Amazônia Brasileira: a região do baixo rio Oiapoque, no estado do Amapá, que comporta as Terras Indígenas Uaçá, Juminã e Galibi; e a região da Calha Norte, especificamente nas áreas referentes às Terras Indígenas do Trombetas-Mapuera e Nhamundá-Trombetas, doravante denominada de Calha Norte[1]. O projeto tem como problema central as precariedades relativas ao acesso à energia limpa, as quais dificultam o cotidiano das populações indígenas destas regiões, limitando as possibilidades de produção de recursos para o acesso a bens que estão, há tempos, incorporados à vida nas aldeias (cf. Andrade, 2007; Silva, 2016; Capiberibe, 2007; Tassinari, 2003; Vidal 1999; Oliveira 2019). Tendo a energia elétrica como fundamento, o projeto abordará a questão da geração de renda com foco na produção de artefatos[2] (cestaria, cerâmica, trabalhos com miçanga e sementes, entre outros) tanto para uso dentro das comunidades como para sua venda. Acrescente-se que, o implemento da energia elétrica é aqui entendido como um subsídio fundamental para uma produção econômica que associe saberes tradicionais[3] à educação escolar formal. Assim, esta proposta estrutura-se num tripé constituído por: 1) geração de energia elétrica sustentável; 2) fomento a cadeias produtivas de artefatos; e 3) relação entre o conhecimento indígena e não indígena. Essas três linhas inter-relacionam-se sustentando a proposta.

A conexão do presente projeto com a chamada "Iniciativa Amazônia +10" se observa em sua proposta de trabalhar a questão energética associada à melhoria na qualidade de vida de diferentes povos indígenas, buscando aliar o uso de novas tecnologias às necessidades locais e aos conhecimentos tradicionais, e tendo como preceito de atuação a co-participação dos povos indígenas das regiões do baixo Oiapoque e da Calha Norte. Para seu desenvolvimento, o projeto irá investigar de maneira aprofundada três questões: 1) a produção, distribuição e necessidade de energia eléctrica; 2) as cadeias de produção de artefatos; 3) a transmissão de conhecimentos dos mais velhos para os jovens, buscando intensificar o diálogo intra e inter geracional.

 

a. De que forma a proposta endereça um ou mais dos três eixos mencionados no Item 3.1 dessa Chamada.

Esta proposta está conectada aos eixos 1 e 3 da presente Chamada. Ela aborda diretamente os problemas 1 e 3 do eixo 1, ou seja, respectivamente, a questão exploratória destrutiva dos recursos naturais que enseja a desvalorização dos produtos locais e a questão da provisão energética insuficiente e de natureza suja. E, no eixo 3 - que trata da questão do fortalecimento de cadeias produtivas sustentáveis -, a proposta se dirige ao problema 1, o qual foca na valorização do conhecimento tradicional. Além disso, o projeto busca integrar os eixos 1 e 3 por meio da produção de energia limpa e sustentável. Com isso, buscamos responder às demandas locais dos povos indígenas das regiões aqui em tela. De maneira mais pontual, a proposta está dirigida para: a) o enfrentamento do problema de acesso das aldeias indígenas à energia limpa e de qualidade (em especial, fotovoltaica) em escolas e centros comunitários; b) para o implemento de meios para a geração de recursos econômicos que associem o saber tradicional a novas tecnologias e conhecimentos.

 

b. De que forma a proposta incorpora cada um dos itens descritos no item 4.1 dessa Chamada.

a) Co-construção: a pergunta que orienta esta proposta foi formulada a partir de uma demanda coletiva por energia elétrica, implementação de cadeias produtivas e valorização do conhecimento tradicional que vêm sendo apresentada às pesquisadoras responsáveis por este projeto, seja por meio de suas vivências nas aldeias, seja por demandas diretas dirigidas a elas[4]. Diga-se, ainda, que tais demandas são apresentadas de maneira recorrente nas Assembleias Indígenas, há anos.

Este projeto é guiado pela pesquisa e educação participativa, com foco no desenvolvimento de uma capacidade de construção coletiva (capacity Building) (Frieri et al., 2021), por meio de uma pesquisa conjunta que envolverá escolas indígenas; comunidades associações e organizações indígenas;  universidades; técnicos do setor público e empresas. Ele foca nas demandas locais e parte dos saberes tradicionais para investigar questões de infraestrutura e outras possibilidades para a integração de novas tecnologias dentro das aldeias. Desde o início, este projeto obedece aos protocolos de consulta dos povos indígenas aqui atendidos.

b) Inter e transdisciplinaridade: a proposta deste projeto contempla duas grandes áreas da Ciência, Ciências Humanas e Ciências Exatas, que estão no projeto postas de forma complementar. A equipe do projeto é formada por pesquisadores das seguintes áreas: antropologia,  arqueologia, linguística, história, engenharia elétrica e da computação. Além disso, o projeto irá contar com especialistas técnicos de distintas áreas (cf. arquivo "descrição das Atividades Desenvolvidas Pela Equipe"). Para além do caráter técnico-científico, entendemos a transdiciplinaridade como a incorporação dos saberes tradicionais, o que está sendo realizado desde a elaboração desta proposta.

c) Inovação: sendo uma pesquisa pensada dentro da linha de capacidade de construção coletiva, a inovação está na conjugação de um conhecimento transdisciplinar que irá trabalhar de forma integrada aspectos relativos à infraestrutura, conhecimentos das humanidades, das ciências exatas e conhecimentos tradicionais. Essa associação permitirá realizar um diagnóstico bem fundamentado e multidimensional das dificuldades enfrentadas pelos povos indígenas em virtude do pouco ou nenhum acesso à energia elétrica; ao mesmo tempo, possibilitará identificar as potencialidades de produção de artefatos e outros subprodutos e, a partir desse diagnóstico, fomentar sua cadeia produtiva, contemplando, entre outras coisas, a denominação de origem, o que agregará valor aos artefatos produzidos.

 

Os subitens d e f estão discriminados no item 7 deste projeto.

e) Recursos humanos de CT&I: todo o projeto está sendo pensado a partir da capacidade de construção coletiva, contemplando e qualificando, assim, o envolvimento de estudantes não indígenas e indígenas, bem como de pessoas das comunidades locais. Isso será desenvolvido na prática por meio da estratégia de pesquisa contínua e participativa, na qual prevemos a troca de conhecimentos entre os mais velhos e mais jovens, e entre o conhecimento indígena e não indígena.

 

c. Qual é a contribuição esperada dos pesquisadores e equipes em cada um dos objetivos propostos pelo projeto?

O projeto será composto por três equipes, cada uma coordenada por uma das pesquisadoras responsáveis. Artionka Capiberibe irá trabalhar diretamente nos temas da energia solar e transformações econômicas, conjuntamente com o professor Luiz Carlos Pereira da Silva na pesquisa e coordenação da equipe responsável pelo levantamento sobre energia solar que será composta pelos estudantes Arlindo Alemão Gregório, Francisca Dulcinéia da Cruz Gomes, Leila Hikari Hashimoto, cujas atividades estão resumidas no documento "Descrição das Atividades Desenvolvidas Pela Equipe". Capiberibe irá supervisionar a bolsa de pós-doutorado "Energia elétrica e transformações econômicas na aldeia Kumenê dos Palikur-Arukwayene", que será alvo de uma seleção. Além disso, irá co-orientar/co-supervisionar, junto com Elissandra Barros, as bolsas TT de Rosileide Costa e Lenise Felício Batista (cf. "Planos de Atividade") e o trabalho da estudante do curso de Licenciatura Indígena, Keyla Felício Iaparrá.

Lilian Rebellato ficará responsável pela equipe da Calha Norte, coordenando tanto o trabalho das cadeias operatórias de produção dos artefatos, co-coordenado por Fernanda Sarmento, como auxiliando no desenvolvimento do plano de comunicação que será desenvolvido por Sérgio Gabriel Baena Chêne, e no levantamento das escolas para a instalação das placas fotovoltaicas. Contará com os alunos indígenas João Kauiri Wai Wai e Rodrigo Gomes do Nascimento, em campo, para o diagnóstico, levantamento das espécies vegetais utilizadas para confecção de artefatos, bem como as melhorias no escoamento dessa produção, também no baixo Oiapoque.

Elissandra Barros, além dos trabalhos de co-orientação, desenvolverá a pesquisa sobre as práticas tradicionais de produção de artefatos, objetivando identificar e fomentar as potenciais cadeias produtivas e os processos de transmissão de conhecimentos. Será responsável também pela articulação com as escolas indígenas, a fim de integrar e agregar os conhecimentos desta pesquisa às necessidades das escolas, tanto no que concerne à estruturação física (instalação de energia limpa) como na produção de materiais didáticos e paradidáticos que auxiliem na transmissão de conhecimento tradicional. Destacamos, que embora o projeto esteja subdividido em três equipes, todas as atividades serão regularmente discutidas e desenvolvidas  em conjunto.

 

4. Resultados esperados:

A energia elétrica potencializou a produção econômica dos povos indígenas Palikur-Arukwayene, Galibi-Marworno, Karipuna e Galibi-Kali'nã na região do baixo rio Oiapoque, a farinha de mandioca lhes permite um incremento em suas fontes de renda, uma vez que são os principais fornecedores desse produto alimentar (e de seus derivados), que é uma parte fundamental da dieta regional (Capiberibe, 2009, p. 217). Na Calha Norte, a energia elétrica também fortaleceu a produção de farinha de mandioca nas aldeias Hixkaryana, Kaxuyana, Waiwai, Katuena, Mawayana e Xereu, principalmente naquelas localizadas próximo aos pólos base da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), o incremento dessa produção foi fundamental em função do aumento populacional, principalmente na aldeia Mapuera que é a de maior concentração populacional (Queiroz, 2008). Além de seu papel na implementação da produção econômica e na adequação às transformações populacionais, a eletricidade é fundamental no processo de educação formal presente em todas as aldeias, permitindo o ensino noturno, o uso de computadores, de impressoras e, sobretudo, o acesso à internet, ferramenta imprescindível nos processos educativos.

Contudo, o fornecimento de energia é precário, insustentável, caro e poluente. Em ambas as regiões, a principal fonte de energia utilizada limita-se aos motores geradores movidos a óleo diesel. Em termos de Brasil, essa tecnologia geradora de eletricidade é minoritária, em torno de pouco mais de 7% (Goldemberg e Lucon, 2007, p. 9), mas nos contextos aqui apresentados, ela conforma a maior parte da produção energética.

A produção de artefatos se constitui também como um meio importante para a geração de renda para os povos de ambas as regiões. Entretanto, falta a essa produção condições favoráveis para gerar cadeias produtivas sustentáveis, um dos problemas fundamentais é a distância entre os produtores de artefatos e o mercado consumidor, contudo o acesso à internet, que hoje existe de forma precária, pode minimizar as distâncias e possibilitar a visibilidade da produção das comunidades e a negociação direta com o consumidor, inclusive de outros estados ou países, haja vista a localização destes povos em regiões de fronteira.

O projeto se direciona para o enfrentamento destes problemas a partir dos três temas aqui trabalhados. Assim, dentre os resultados esperados em relação à energia elétrica, estão: 1) o mapeamento das dificuldades relativas ao acesso e à geração de eletricidade; 2) que tipos de fontes energéticas são mais adequadas a estas duas regiões (fotovoltaica, biomassa, PCH); 3) a quantificação das necessidades energéticas de cada aldeia; 4) a instalação de placas solares em escolas e centros comunitários visando a melhoria da qualidade do desempenho escolar, associadas à regularização do acesso à internet. Em relação às cadeias produtivas, os resultados esperados são: 1) a identificação das espécies vegetais e dos materiais utilizados para a produção de artefatos que ainda não foram mapeados na literatura científica; 2) a plotagem dos locais de extração dessas matérias primas; 3) a quantificação do tempo de preparo desses materiais, desde sua fonte até sua confecção; 4) a relação entre a história desses artefatos e suas transformações  contemporâneas. No que diz respeito à relação entre conhecimentos tradicionais e conhecimentos técnico-científicos, os resultados esperados são: 1) a organização de um acervo de dados linguísticos, etnográficos e históricos produzidos no projeto, bem como a incorporação a este acervo de dados coletados em pesquisas anteriores, coordenados pelas proponentes; 2) o aperfeiçoamento das técnicas de produção dos artefatos, enfocando, principalmente, o aproveitamento da matéria-prima (madeira, sementes, argila etc.) e seu uso sustentável e renovável; 3) a divulgação científica e a autoria coletiva dos resultados da pesquisa, considerando que os mestres tradicionais são os maiores detentores dos conhecimentos sobre a cadeia produtiva dos artefatos.

 

Desafios científicos e tecnológicos e os meios e métodos para superá-los

Atender às demandas por energia elétrica sustentável e melhoria nas condições de vida, postas pelos povos indígenas das regiões do baixo Oiapoque e da Calha Norte, é um desafio às pesquisadoras proponentes deste projeto. Isso se dá não somente pelos altos custos dos equipamentos necessários para suprir essas demandas, mas pelas dificuldades em prover estas necessidades para populações que se encontram distantes dos centros fornecedores de tecnologia, conhecimento e mão-de-obra especializada, o que implica em dificuldades estruturais e logísticas que o projeto se propõe a superar.

O desafio científico a ser enfrentado por esta proposta será o diálogo transdisciplinar, ou seja, o estabelecimento de uma metodologia de pesquisa que permita potencializar os diferentes conhecimentos envolvidos no projeto. Da superação do desafio científico depende a superação do desafio tecnológico, tanto para a criação de plataformas de informação que reúnam dados formulados pelo léxico das diferentes áreas científicas  envolvidas (humanidades e exatas) e do conhecimento tradicional de modo congruente; como para a implementação de soluções tecnológicas que permitam dar conta, de maneira ajustada à realidade local, dos problemas apontados neste projeto, a saber: as precariedades da produção e distribuição de energia elétrica que impactam questões de natureza econômica e social.

Aliado ao desafio transdisciplinar encontram-se as barreiras linguísticas e socioculturais[5]. Em relação ao desafio linguístico e sociocultural, impõe-se a necessidade de vários tipos de tradução. Na Calha Norte, há mais de dez línguas indígenas faladas, no baixo Oiapoque, há duas línguas indígenas correntes. Cada um dos povos envolvidos possui uma história de relação com os não indígenas distinta e modos de ser e de viver igualmente diferentes entre si. Esse cenário impõe a necessidade de conhecimentos linguísticos e antropológicos aprofundados cujo desconhecimento dificultaria um projeto desta envergadura, no entanto, a equipe é composta por profissionais com muitos anos de pesquisa e experiência nas regiões aqui tratadas e também por indígenas com formação acadêmica.

A superação desses desafios se dará pela abordagem metodológica do projeto, a qual envolverá dados qualitativos e quantitativos. Quanto aos dados quantitativos, o projeto visa determinar de modo preciso as necessidades das pessoas que vivem nas regiões as quais o projeto abrange, isto é, oferecer energia elétrica a escolas e centros comunitários. Em paralelo aos mapeamentos relativos à energia elétrica, o projeto irá trabalhar no planejamento das cadeias operatórias de produção de artefatos. A estratégia metodológica para tanto será a de produzir diagnósticos. No que diz respeito, por exemplo, ao uso dos produtos da floresta para a confecção de artefatos, a intenção é fazer um diagnóstico das espécies utilizadas na fabricação de objetos artísticos, de adorno ou funcionais, como construção de casas e cestarias. Esse diagnóstico poderá ser utilizado para um futuro manejo de espécies florestais para aumento e preservação da biodiversidade nos territórios indígenas em questão. Outro diagnóstico a ser feito é o relativo aos tipos de energia elétrica que vem sendo utilizados nas escolas e centros comunitários de ambas regiões. Aliado a isso, será feito um levantamento sobre o uso de aparelhos elétricos para o cálculo das voltagens para cada ponto que deve receber a energia fotovoltaica e para o conhecimento osbre as transformações econômicas produzidas pelo acesso à energia elétrica.

A ausência de referências que tratem especificamente sobre o tripé aqui detalhado é um indicativo dos desafios aqui apresentados. Há uma produção relativa especificamente à confecção de artefatos na região do Amapá e Norte do Pará (Van Velthem; Lux Vidal (IEPÉ) e também o importante trabalho desenvolvido na elaboração do projeto e da implementação do Museu Kuahi (Museu dos Povos Indígenas do Oiapoque), um museu etnológico de referência, por ter sido criado por demanda dos povos indígenas da região e desenvolvido em parceria direta com eles. O Kuahi foi sendo montado por meio de um acervo encomendado aos artistas, sábios e mestres nos saberes indígenas, o qual fomentou a produção e recriação de artefatos, assim como a transmissão geracional de conhecimentos. Em paralelo, o projeto do museu realizou oficinas de formação museológica e administrativa oferecidas a jovens indígenas Palikur, Galibi-Marworno, Galibi-Kali’na e Karipuna (Vidal, 2008). Entretanto, o Kuahi, sendo um museu vinculado ao poder público, viu-se sem apoio e, há cerca de cinco anos, encontra-se fechado a visitação. A descontinuidade dessa iniciativa, que aqueceu por cerca de vinte anos a produção sistemática de artefatos, implicou no enfraquecimento da transmissão geracional dos saberes e impactou a geração de renda das famílias indígenas.

A presente proposta tem como um de seus objetivos fomentar a cadeia produtiva dos artefatos de modo a torna-la sustentável e para isso contará com o implemento da eletricidade nas comunidades indígenas, isso possibilitará o acesso dos produtores à internet que, por sua vez, servirá de vitrine para esta produção. A proposta fará isso a partir de uma metodologia de pesquisa aplicada que envolve a coleta de dados, o armazenamento ordenado destes dados e a capacitação técnica de jovens indígenas, seja para a manipulação dos dados armazenados e para sua divulgação; seja para a manipulação das ferramentas tecnológicas da energia solar; assim como, para o trabalho com as ferramentas da internet (sites, redes sociais etc.) para a comunicação e divulgação.

 

 

[1] As TIs. Uaçá, Juminã e Galibi somam pouco mais de 500.000 ha, nelas vivem mais de 7000 mil pessoas pertencentes a quatro povos indígenas diferentes: os Palikur-Arukwayene, os Galibi-Marworno, os Galibi-Kali'na e os Karipuna do Amapá (Dados populacionais da Enciclopédia dos Povos Indígenas no Brasil, em https://pib.socioambiental.org/pt/c/quadro-geral , acessada em: 05/08/2022). Na  região dos rios Trombetas-Mapuera e Nhamundá-Trombetas vivem povos de várias etnias, inclusive grupos isolados, ocupando uma área de 3.970.418 ha (Queiroz, 2008) num território que faz fronteira com outras Terras Indígenas: a oeste, com a TI Waimiri-Atroari; a leste, com a TI Kaxuyana-Tunayana; nas vizinhanças destas Terras Indígenas, com as TI Wajãpi e Zo'é; e, ao norte, faz fronteira com a República da Guiana. Esta região da Calha Norte compõe o maior corredor de áreas protegidas do mundo (Queiroz, 2008), ao mesmo tempo em que se constitui por uma grande diversidade linguística, cultural e étnica.

[2] Seguindo a definição de Lagrou e Van Velthem, denominamos de artefatos uma produção que não está restrita ao conhecimento e manipulação individual, sendo acessível ao coletivo e podendo ser reproduzida e/ou transformada a partir de processos criativos que "recria[m] estilos estéticos através da atividade de muitas pessoas produzindo juntas artefatos que se assemelham, mas não por isso deixam se ser únicos" (2018, p. 1)

[3] Conhecimento tradicional (ou saber tradicional) expressa aqui uma forma de saber não fixa, ou seja, como passível de transformação, afastando-se com isso da ideia de um conhecimento entesourado e que atravessa o tempo intocado. Para uma maior complexificação sobre os sentidos do qualificativo "tradicional" para o conhecimento dos povos indígenas ver Manuela Carneiro da Cunha (2009).

[4] Buscando responder a estas demandas, de 2014 ao presente, Elissandra Barros coordena o projeto "Saberes Indígenas na Escola"; a partir de 2021, Lilian Rebellato coordena o projeto "Repatriação digital de Coleções Indígenas"; em 2020, Artionka Capiberibe coordenou o projeto "Instalação de Placas Solares nos Polos Base     de Kumenê e Kumarumã".

[5] Lembrando que quando se trata de pesquisas com povos indígenas dificuldades logísticas se apresentam, sendo uma delas as distâncias a serem superadas para alcançar algumas Terras Indígenas.