Este trabalho se insere na polêmica a respeito do caráter utópico da República de Platão. A tese é que só é legítimo considerar a República a utopia fundadora da literatura ocidental, se a obra for considerada, ao mesmo tempo, a primeira crítica da utopia da literatura ocidental. Diremos que os diversos paradigmas ali expostos são contestados por gestos dramáticos e teorias filosóficas abertamente pessimistas, e que este é o cerne da crítica em questão. No primeiro capítulo, nos concentraremos no gesto dramático em que a zombaria e o ridículo são utilizados como meios para impedir certas posições ingênuas e otimistas de Sócrates em relação à motivação humana. Veremos aqui um pessimismo implícito. No segundo capítulo, observaremos como Sócrates, ao mesmo tempo que constrói os diversos paradigmas, desenvolve, paralelamente, teorias propriamente filosóficas de conteúdo pessimista denso e explícito. Tentaremos extrair esse conteúdo colocando especial ênfase na teoria da alma tripartida e na alegoria da caverna, com o intuito de mostrar como nelas se desdobra uma visão (i) da interioridade humana em que o conflito interno entre as partes da alma é inevitável e, conseqüentemente, o estado psíquico ótimo, inatingível e (ii) do conhecimento, no qual a compreensão e comunicação da ideia do Bem escapa à inteligência humana, mesmo para as almas mais bem dotadas e educadas. Diremos que, por esses motivos, o ideal do filósofo, isto é, o ideal do domínio de si com base na razão esclarecida, é de consecução duvidosa e improvável, tornando assim duvidosa e improvável a figura do rei-filósofo e, portanto, também da Kallipolis sob sua regência. No terceiro capítulo, nos concentraremos no fenômeno do pessimismo, procurando expor suas raízes e percorrer a literatura secundária que o situa em relação ao pensamento platônico, em especial o da República. Concluiremos que, longe de constituir um paradoxo ou uma contradição, a República, neste contexto específico, apresenta-se como um exercício sem pretensões conclusivas mas intencionalmente aberto, cuja mensagem reside antes em uma recomendação metodológica relativa à procura da melhor vida possível—mas não em uma norma definitiva ou uma proposta igualmente consolidada para o seu empreendimento. Platão embarca na construção do ideal, mas convida simultaneamente a uma crítica desse ideal a partir da consideração exaustiva e filosófica das condições da experiência, apresentadas em toda a sua adversidade, bem como a uma ação positiva sobre tal experiência em direção ao ideal, não no sentido da sua realização final e absoluta, que se assume, no interior da própria obra e nas antípodas dos escritos utópicos tradicionais, impossível e até indesejável, mas em um sentido vinculado à resiliência, centrado na redução de danos e orientado a um progresso limitado, embora possível.
Utopia e Pessimismo na República de Platão
Data da defesa:
sexta-feira, 22 Janeiro, 2021 - 17:00
Membros da Banca:
Presidente Prof. Dr. Lucas Angioni IFCH / UNICAMP
Membros Titulares Dr. Breno Andrade Zuppolini Universidade Estadual de Campinas
Dr. Fernando Décio Porto Muniz Universidade Federal Fluminense
Dra. Inara Zanuzzi Universidade Estadual de Campin
Dra. Carolina de Melo Bomfim Araújo Universidade Federal do Rio de Janeiro
Membros Suplentes Dr. Roberto Grasso Universidade Federal da Paraíba
Profa. Dra. Yara Adario Frateschi IFCH / UNICAMP
Prof. Dr. Marcio Augusto Damin Custodio IFCH / UNICAMP
Programa:
Nome do Aluno:
Natalia Costa Rugnitz
Sala da defesa:
Integralmente a Distância - link Google Meets : https://stream.meet.google.com/stream/d04c5808-2c92-461d-b3ee-ec01a76edc9e?authuser=1