O propósito dessa pesquisa é investigar a noção de movimento no Le monde de Descartes, com especial atenção para a doutrina da criação ali apresentada. Levanta-se a hipótese de que a doutrina da criação do Le monde vai de encontro às interpretações ocasionalistas da filosofia cartesiana. Os ocasionalistas propõem que há em Descartes um processo constante de criação, em que Deus intervém constantemente na modificação dos corpos, sendo ele a causa de transferência de movimento de uma parte a outra da matéria. Contudo, parece-nos que a doutrina da criação no Le monde, conjuntamente com a teoria do movimento ali presente, permite-nos contrapor a leitura ocasionalista, na medida em que, nesta obra, Descartes parece apresentar uma causa para transformação dos corpos diferente da causa criadora. Diante disso, pretendemos arguir a favor da hipótese de que a matéria em movimento, criada por Deus, é a causa eficiente das transformações dos corpos, motivo pelo qual Deus não intervém intermitentemente no mundo. Como consequência, encontramos em Descartes um Deus criador, mas não um Deus interventor.