Hereges dialéticos: um estudo sobre a escolástica nos séculos XI e XII

Esta tese discute de maneira sistemática tanto as acusações quanto as condenações por heresia que foram produzidas no ambiente escolar dos séculos XI e XII na Europa ocidental. Atendo-se aos mestres de escolas desse período, analisa-se um tema marginalizado pelos historiadores que, ao centrarem seus estudos nos grandes grupos heréticos ou nas chamadas “heresias populares”, trataram as heresias do meio escolar como casos isolados. Indo de encontro a essa postura, o presente trabalho pretende discutir se essas ocorrências corresponderiam a um fenômeno mais amplo e poderiam estar relacionados com contextos e aspectos convergentes. Para tanto, examinou-se os casos de Berengário de Tours (c. 999 - 1088), Roscelino de Compiègne (1050 - 1125), Pedro Abelardo (1079 - 1142) e Gilberto de Poitiers (1076 - 1154) com o intuito de compreender como e por que foram acusados, julgados e, eventualmente, condenados. Ao fazê-lo, partiu-se de uma análise multidimensional que buscou demonstrar as similaridades entre os casos – sem, é claro, omitir as particularidades – com o intuito de demonstrar que se tratava, de fato, de um fenômeno mais amplo. Desse modo, a abordagem consistiu no estudo de três dimensões: 1) uma epistemológica, a saber, a consideração de que o que estava em jogo não eram apenas os limites do intelecto humano em apreender dados do sobrenatural, mas, também, fazer da “verdade revelada” uma ciência ao buscar expô-la como um conjunto de processos que respondiam a uma lógica e a uma razão compreensível; 2) uma sócio-política, afinal, do mesmo modo que esses mestres de escola só puderam construir suas carreiras porque determinadas condições sociais, políticas e econômicas assim permitiram, as acusações e condenações que sofreram estava a elas relacionadas; 3) e, por fim, uma dimensão ético-moral, uma vez que mais do que simples intérpretes das artes liberais e das autoridades sagradas, esperava-se que esses mestres fossem exemplos de conduta.