A Forma Aguda do Infinito Um estudo sobre o Barroco e a Espanha do Siglo de Oro na Filosofia de Espinosa

Partindo das categorias de época e estilo, esse estudo recupera as formulações de Carl Gebhardt, segundo as quais a filosofia de Espinosa seria uma genuína expressão do Barroco. Procurando
avaliar a pertinência dessa hipótese, mostramos que o infinito, desde a obra de Heinrich Wölfflin, Renaissance und Barock (1888), é identificado com o Barroco por meio do sentimento do sublime provocado pela fruição da monumentalidade dos espaços arquitetônicos. Espinosa é o filósofo que elabora uma metafísica geométrica que reflete o infinito progresso da natureza a partir de uma substância absolutamente infinita, que se expressa por atributos infinitos em seu gênero, da qual se seguem efeitos infinitos em número infinito de modos. É o filósofo que enxerga o infinito em seus diversos ângulos e que extrai dele a origem da mente, sua natureza e salvação mediante o aumento de sua perfeição, entendida como a expansão de sua parte eterna e imperecível. O meio hispano-português de Amsterdã onde Espinosa nasceu vivia a experiência de redescobrir o judaísmo mas simultaneamente reafirmava suas origens portuguesa e espanhola refletida em sua vertiginosa produção literária barroca e nas inúmeras traduções, para o espanhol, de obras da filosofia judaica medieval, como o Guia dos Perplexos de Maimônides. A elite sefardita, ao mesmo tempo que inventava seu judaísmo próprio, reproduzia a formação barroca da Ratio Studiorum da Companhia de Jesus que recebera nas escolas e universidades católicas da península ibérica e que valorizava ao máximo o conhecimento das letras, da gramática e das línguas. E na medida em que afirma a tradição medieval árabo-judaica ao retomar o infinito atual de Hasdai Crescas inserindo-o no princípio de sua doutrina, Espinosa afirma o elemento cultural apontado por estudiosos como o fator nevrálgico capaz de modificar o Renascimento vindo da península itálica e dar forma ao Barroco na Espanha. Além do mais, o filósofo possuía em sua biblioteca o suprassumo do Barroco literário produzido na Espanha do Siglo de Oro de onde procuramos vestígios materiais e conceituais de algumas dessas obras em sua filosofia. Aplicando as considerações de Agudeza y Arte de Ingenio de Baltasar Gracián à formulações de Espinosa, procuramos detectar procedimentos conceituais e retóricos próprios do Siglo de Oro, como o uso dos oxímoros. Argumentamos que a própria ideia de uma filosofia cujo modelo é dado por uma metafísica da imanência e pela geometria genética são expressões da agudeza cujo emblema é a produção de uma teoria da verdade nos moldes do contínuo, que recusa qualquer positividade discreta à “forma do erro”, expressando assim uma perspectiva inclusiva e cosmopolita conforme à grande expansão da experiência e da racionalidade da época barroca, que parece anular as dicotomias estanques e dar à noção de “processo” o centro de gravidade do pensamento. Procuramos mostrar também que a ideia de uma Religio Philosophica em Espinosa é um caso emblemático do contradiscurso quando compreendido, não como resíduo do judaísmo, mas como expressão da agudeza que lê trechos das escrituras e disputa seu sentido atribuindo a determinadas passagens e personagens, conteúdos da sua doutrina filosófica. O que revela também uma impossibilidade de separação absoluta entre filosofia e teologia, uma vez que, pela apresentação de um método histórico crítico, pela existência da elocução religiosa constitutiva do discurso racional e a simultânea valorização do livre exame crítico da Escritura, o filósofo subverte a noção de “intérprete autorizado”, deslocando o lugar da teologia e do teólogo. Por fim, procuramos destacar os “pontos de contato” ou “pontos de excitação”, (como na expressão da língua alemã Anregungspunkt) entre Espinosa e alguns autores de sua biblioteca. Valorizamos assim as origens e inclinações do filósofo como expressões do barroco (e não de um iluminismo avant la lettre como hoje parece difundido) e de seu pertencimento, mesmo que problemático, ao acervo cultural ibérico. Palavras-chave: Gebhardt, Barroco, Estilo, Época, Infinito, Espanha, Biblioteca, Siglo de Oro, Geometría, Cosmopolitismo, Retórica, Contradiscurso, Agudeza, Teologia, Religião.

Data da defesa: 
sexta-feira, 26 Abril, 2024 - 13:00
Membros da Banca: 
Presidente Prof. Dr. Marcio Augusto Damin Custodio IFCH/ UNICAMP
Membros Titulares Profa. Dra. Fátima Regina Rodrigues Évora IFCH/ UNICAMP
Profa. Dra. Lia Levy Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Prof. Dr. Ivan Domingues Universidade Federal de Minas Gerais
Profa. Dra. Simona Langella Universita Degli Studi di Genova
Membros Suplentes Prof. Dr. Giorgio Gonçalves Ferreira Universidade do Estado da Bahia
Profa. Dra. Monique Hulshof IFCH/ UNICAMP
Prof. Dr. Matheus Barreto Pazos de Oliveira Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Comissão de Programa de Pós-Graduação em Filosofia Este
Programa: 
Nome do Aluno: 
Francisco Guerra Ferraz
Sala da defesa: 
Sala de Defesas de Teses I