A análise da literatura sobre pobreza mostra que as pesquisas na área, sejam estas direcionadas a uma localidade específica, a um país ou a uma região inteira, procuram analisar as principais dinâmicas ocorridas em determinado período, utilizando uma abordagem específica de pobreza para compreender o fenômeno. É comum, neste sentido, focar em metodologias de mensuração ou em estratégias de modelagem estatística, buscando tecer relações entre a dinâmica da pobreza e os processos de crescimento e desenvolvimento econômico. Estas pesquisas, independente do enfoque adotado, partem de definições objetivas de pobreza, delimitando seu método de mensuração. Ainda que a corrente da pobreza multidimensional tenha ganhado espaço na literatura e nas aplicações para formulação de políticas públicas de combate e erradicação da pobreza, é preciso observar que a dinâmica demográfica, dentre elas a migração interna, tem impactos sobre a pobreza e todas as suas dimensões relevantes (estrutura, perfil e distribuição). Como estes elementos se alteram no tempo, é importante ampliar nosso olhar e nossas análises sobre os porquês de as características da pobreza em determinados lugares terem se alterado no tempo.
Outro quesito a considerar é a heterogeneidade social, já que as características sociodemográficas da população não são fixas nem no tempo, nem no espaço. Ademais, as condições que levaram à pobreza (ou à saída dela) não são iguais para todos, nem acontecem nos mesmos tempo e ritmo. Por fim, existem dois componentes, um de heterogeneidade e outro de desigualdade (espacial e social) a serem incluídos. Ainda que acontecimentos acometam várias pessoas e localidades ao mesmo tempo, a resposta a eles varia conforme quem é afetado e sua capacidade de reagir a adversidades. A partir destes elementos, é possível selecionar alguns critérios de segmentação para analisar a pobreza: sexo, idade, raça/cor, condição migratória e situação do domicílio são apenas alguns dos que compõem os poverty profiles. Estes são significativos por permitirem dividir a população em grupos homogêneos sem deixar de avaliar as heterogeneidades no tempo, no espaço, entre os grupos e dentro deles. Ademais, incluir tanto o estrato socioeconômico como a localização espacial da população permite analisar a evolução da pobreza não só estudando os pobres em si, mas também os comparando aos não-pobres, de um lado, e entre si em diferentes espaços, de outro.
Por fim, há também a possibilidade de combinar metodologias diferentes para estudar a pobreza a partir de diversos pontos de observação. É importante considerar, além da análise de índices de pobreza multidimensionais (e seus componentes), qual a composição da população pobre, como varia no tempo e no espaço e quais as principais carências de cada grupo. Em termos espaciais, a combinação de recortes macro (observando o estado inteiro) a análises micro (a nível municipal) é uma estratégia para compreender os processos espaciais e demográficos que convivem com a pobreza. Por fim, a utilização de mais de uma fonte de dados para um período amplo é necessária para compreender os fenômenos sociais, econômicos e demográficos envolvidos na dinâmica da pobreza.
Considerando tais elementos, esta tese analisa as mudanças nas dinâmicas sociodemográfica, espacial e migratória da população pobre no Estado de São Paulo entre 1991 e 2015, a partir da seguinte pergunta: há indícios que apontem, à luz dos diversos eventos econômicos e sociais, para um processo de (re)configuração desigual, tanto socioespacial como demográfica, da pobreza? Para nortear a pesquisa, parte-se da hipótese de que a construção social da pobreza se reflete em sua espacialização desigual e em seus diferenciais sociodemográficos, sendo a migração um elemento importante para construir esta espacialização. Nesta direção, o processo de reestruturação produtiva tem alterado a dinâmica (espacial e demográfica) da pobreza, sua evolução e sua caracterização e contribui expressivamente para o processo de (re)configuração (espacial e social) da pobreza.
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