ENTRE A ESCUTA DAS IMAGENS E A MATERIALIDADE DO TEMPO: DUAS EXPERIÊNCIAS FILMOGRÁFICAS

A partir de imagens construídas em duas experiências filmográficas, esta tese analisa o conceito de “patrimônio cultural imaterial” e busca uma articulação entre memórias e materialidades como método para conduzir a etnografia. A materialidade do imaterial é abordada por meio dessas experiências e à luz das tensões, possibilidades e dualidades presentes no campo do patrimônio. Utilizo como objeto de estudo minha própria trajetória como documentarista e, em especial, a realização dos documentários expandidos Cine Rabeca e Som dos Sinos. A sonoridade dos mundos em que tocam sinos e rabecas constitui uma experiência social complexa do tempo, capaz de criar caminhos para perceber aquilo que vibra na matéria das coisas. As imagens revelam as relações contidas naquilo que a sonoridade dos instrumentos evoca e tem a potência de criar. Utilizando categorias êmicas do mundo do cinema como instrumentos analíticos, a construção etnográfica baseou-se no cruzamento entre memórias latentes da experiência, teorias do cinema e da antropologia e o contexto criado no processo da escrita. A antropóloga provoca a documentarista através da análise das experiências que se transmutam em campo, abordando a imagem como dispositivo de criação de mundos e atravessamento do tempo. Nesta composição, o ato fílmico perpassa as relações entre o visível e o imaginado, entre a memória e a experiência do presente. Dessa forma, foi realizada uma reflexão em torno da relação entre a materialidade ontológica da imagem e a vida que se transforma em imagem. O trabalho investiga em que medida a relação entre acervo, tempo e patrimônio se articula com destruição e vestígios, mas também com a (re) interpretação de mundos. Compõe o texto uma combinação de sons, poesia, vídeos, fragmentos literários e fotografias, que busca construir um diálogo sensorial com os conceitos discutidos, como a imagem-lembrança, o extracampo e a montagem.