Dilemas da judicialização da violência de gênero: mediação de conflitos e Lei Maria da Penha

A Lei Maria da Penha (LMP), promulgada em 2006, é reconhecida como um marco no processo de construção e reconhecimento dos direitos das mulheres, e propõe uma maneira distinta de lidar com violência contra as mulheres que ocorra no âmbito doméstico, familiar ou em qualquer relação íntima de afeto. Simultaneamente à implementação da LMP, vemos crescer no Brasil o interesse pelas formas consensuais de administração de conflitos, principalmente a mediação e a conciliação, que passam a ser incorporadas, reconhecidas e ofertadas pelo Estado como formas adequadas de se lidar com o conflito. Duas maneiras distintas de lidar com conflitos, crimes e violência, a Lei Maria da Penha e a mediação de conflitos, se encontram no Projeto Íntegra que realiza mediação de conflitos em casos encaminhados pela vara de violência doméstica e familiar contra a mulher, trabalho esse etnografado durante a pesquisa de doutorado. Estando diante de uma prática que busca inovar ao propor uma nova abordagem para os conflitos em diálogo com a vara de violência doméstica, com atores institucionais, as leis vigentes e entre as pessoas que participam da mediação, mostrou-se importante descrever esse fazer. A etnografia realizada pode ser dividida em três momentos distintos: observação da mediação de conflitos, participação como aluna do curso de formação de mediadores e conciliadores e atuação como mediadora de conflitos. Durante a pesquisa etnografei as pré-mediações e as sessões de mediação acompanhando inúmeros casos, dentre os quais 15 casos desde o início até a sua finalização, atuei como mediadora em seis casos, etnografei outras frentes de trabalho realizadas no local, além de acompanhar a mediadora em suas conversas com juízes/as, promotores/as, defensores/as e escreventes. Ao descrever o fazer da mediação, a relação que os atores e atrizes estabelecem, os caminhos percorridos, buscamos pensar sobre o direito construído, as práticas estabelecidas e em constante diálogo com as leis vigentes. Descrever o emaranhado de relações estabelecidas e as práticas e pensar sobre os seus significados é a tarefa que se propôs a presente pesquisa, que tem o objetivo de entender o significado das práticas acionadas no espaço judicial quando a aposta é no diálogo entre as partes como forma de administração de conflitos. Buscamos mostrar ao longo da tese que a justiça do diálogo proposta pelo Projeto Íntegra coexiste com a justiça formal, reforça a importância dessa última e legitima seus procedimentos e sua institucionalidade, já que se entende que estar em mediação de conflitos não exclui a necessidade de proteção, de que seja imposta uma decisão judicial em relação a direitos violados e que continuam em discussão no processo criminal em andamento. Não há uma oposição entre a justiça do diálogo e a justiça formal, e sim uma relação complementar a partir de casos concretos que demandam respostas de distintas áreas do direito e de outras áreas de conhecimento.

Data da defesa: 
quarta-feira, 23 Setembro, 2020 - 17:00
Membros da Banca: 
Dra. Guita Grin Debert (Presidente) - UNICAMP
Dra. Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer - USP
Dra. Maíra Rocha Machado - FGV
Dr. Theóphilos Rifiotis - UFSC
Dra. Maria Filomena Gregori - UNICAMP
Nome do Aluno: 
Tatiana Santos Perrone
Sala da defesa: 
Integralmente à distância - https://stream.meet.google.com/stream/d23b1ec2-8d27-4069-bd5f-89226306638f