Nesta tese descrevo e analiso diferentes trajetórias do conceito de desejo sexual. Informado pelos estudos sociais da ciência e adotando uma abordagem etnográfica multisituada, busco assinalar a multiplicidade e o dinamismo das definições em torno dessa categoria no universo científico-especializado e do ativismo social. Os argumentos focam, sobretudo, na reflexão sobre os contextos de produção e divulgação de conhecimentos e tecnologias por meio dos quais versões a respeito do desejo sexual são consolidadas ou questionadas, indicando as agendas e as táticas dos agentes envolvidos nessas formulações. Inicialmente, traço o nomadismo da trajetória assumida por tal conceito na sexologia. Com base em uma análise de publicações clássicas desse campo, caracterizo as ansiedades sociais e exigências científicas que regem sua emergência em meados do século XIX, então englobado pela noção de “instinto sexual”, passando por momentos de descontinuidade histórica e sendo retomado no marco da sexologia moderna, quando da proposição da categoria diagnóstica “transtorno do desejo sexual inibido”. Em um seguinte plano de análise, demonstro como a partir da virada do milênio o conceito transita e é afetado por um novo campo de problematizações e disputas, o dos tratamentos farmacológicos das “disfunções sexuais” masculinas e femininas. Por um lado, o desejo sexual é relativamente ofuscado quando se trata da sexualidade dos homens. Torna-se um conceito adjacente e prescindível em materiais de divulgação de medicamentos para a “disfunção erétil” dirigidos a profissionais clínicos e pacientes, assim como na construção midiática realizada em torno do medicamento Viagra no período de seu lançamento. Por outro, na esteira da intensificação do processo de farmaceuticalização dos problemas sexuais, o conceito é colocado no centro do intenso debate sociotécnico que acompanhou os processos regulatórios de medicamentos indicados para o tratamento da falta de desejo sexual das mulheres nos Estados Unidos, configurando uma controvérsia entre representantes de laboratórios farmacêuticos e grupos feministas. Seguindo os deslocamentos do conceito de desejo sexual, abordo sua incorporação no campo científico-especializado sobre a velhice e seus efeitos, ressaltando especialmente as moralidades sexuais e científicas suscitadas à deriva desse processo. Por último, destaco as estratégias adotadas por pessoas ditas assexuais em sua tentativa por legitimar a normalidade de uma existência sem interesse por sexo por meio da introdução e validação de suas ideias sobre atração sexual e desejo no universo especializado. A análise de cada um desses lócus de observação é o que sustenta o argumento da tese sobre o caráter nômade e produtivo da noção de desejo sexual.
DESEJOS CONTINGENTES E OBRIGATÓRIOS: produção científico-tecnológica, politização da sexualidade e o conceito de desejo sexual
Data da defesa:
terça-feira, 26 Janeiro, 2021 - 17:00
Membros da Banca:
Dra. Guita Grin Debert (Presidente) - UNICAMP
Profa. Dra. Daniela Tonelli Manica - UNICAMP
Dra. Maria Conceição da Costa - UNICAMP
Dra. Jane Araujo Russo - UERJ
Dra. Ana Teresa Acatauassú Venancio - Fiocruz
Programa:
Nome do Aluno:
Mauro Martins Costa Brigeiro
Sala da defesa:
Integralmente à distância