Andando pelo Caminho Vermelho: por uma contracolonização do corpo

Buscamos, nesta tese, realizar uma cartografia – o desenho de um mapa em movimento, que se faz ao mesmo tempo em que as paisagens (psicossociais) são desmontadas e remontadas –, de algumas práticas xamânicas que têm ganhado visibilidade a partir de relações cada vez mais profícuas entre indígenas e não indígenas. Tomamos como ponto de entrada uma dessas relações: a chegada de algumas práticas e substâncias a um grupo Guarani. Tais práticas podem ser vistas sob a alcunha genérica de Caminho Vermelho – um conceito de inspiração Lakota que, desterritorializado de suas origens, começa a circular por todo o continente americano. Com uma criativa e política de “antropofagização” de tais práticas, algumas aldeias guarani passaram a realizá-las em suas terras. Em meu primeiro contato com Geraldo, líder indígena guarani, fui logo advertido que poderia pesquisá-las desde que aceitasse “experimentá-las em meu próprio corpo”. Sendo assim, essa pesquisa parte da premissa de minha participação ativa e da tentativa de relatar experiências muitas vezes tomadas como íntimas, subjetivas e profundas. A fenomenologia e seu apreço pelo corpo e pela experiência foi um porto seguro para a teoria que aqui esboçamos. Teoria esta que encontrou na virada afetiva – a importância e explicitação dada aos encontros de corpos, emoções, sensações e sentimentos – uma maneira para escapar do solipsismo da experiência (afinal, como falar da ayahuasca sem dizer “vá lá e experimente você mesmo”?), atentando-se aos efeitos (e afetos) que essas práticas despertam e ao uso (micro)político que muitos grupos, especialmente os Guarani, têm feito delas. Um dos principais efeitos que encontramos em campo é o conceito por mim (re)formulado de uma “contracolonização do corpo”. Dialogando com a teoria pós-colonial e com ideias recorrentes como a de(s)colonização do conhecimento e do pensamento, propomos uma aparente inversão: se o corpo é de suma importância para as cosmologias ameríndias, é necessário de(s)colonizá-lo antes, ou melhor, contracolonizá-lo. Não apenas desfazê-lo e reconstruí-lo em oposição, mas efetuar um corpo política e micropoliticamente contrário ao colonialismo e suas atuais associações (patriarcado, capitalismo, racismo etc.). Encontramos assim, nas chamadas plantas mestras (e em todas as práticas associadas) e nos efeitos corporais por elas suscitados, uma possibilidade para a construção desse corpo, com todos os afetos envolvidos, já que, frequentemente, essas práticas são poderosos dispositivos – uma máquina – de incorporação dos outros, utilizadas habilmente pelos indígenas. Nesse processo é fundamental que os corpos, dos brancos, principalmente, sejam re-feitos, contra-feitos, pacificados, domesticados, contracolonizados.

Data da defesa: 
terça-feira, 7 Junho, 2022 - 14:00
Membros da Banca: 
Prof. Dr. Ronaldo Romulo Machado de Almeida (Orientador) - IFCH/ UNICAMP
Prof. Dr. Rodrigo Ferreira Toniol - IFCH/ UNICAMP
Prof. Dr. Geraldo Luciano Andrello - Universidade Federal de São Carlos /São Carlos
Profa. Dra. Valéria Mendonça de Macedo - Universidade Federal de São Paulo /São Paulo
Profa. Dra. Angela Renee de la Torre Castellanos - Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología Social /Cidade do México
Profa. Dra. Joana Cabral de Oliveira - IFCH/ UNICAMP - SUPLENTE
Profa. Dra. Isabel Santana de Rose - Universidade Federal de Alagoas /Maceió
Profa. Dra. Maria Suely Kofes - IFCH/ UNICAMP - SUPLENTE
Nome do Aluno: 
Rodrigo Iamarino Caravita
Sala da defesa: 
Sala de Teses 1 - IFCH/UNICAMP - https://meet.google.com/qie-nrno-rbg