Adriana Abreu Magalhães Dias

Data da publicação: ter, 31/01/2023 - 09h35min

O Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Unicamp se despede de Adriana Dias, pesquisadora aqui formada, que produziu trabalhos de referência tanto sobre o neonazismo no Brasil quanto sobre a deficiência e a acessibilidade. Incansável e extremamente corajosa, terá seu legado por nós sempre rememorado. 

O texto abaixo é de autoria de Suely Kofes, professora do PPGAS, orientadora e amiga de Adriana.

 

Obituário Adriana Abreu Magalhães Dias

Se um obituário é uma escrita biográfica, melhor seria não começar pelas datas, as convencionais do nascimento e morte. Uma vida contínua nos vestígios que permanecem entre os vivos. Pelo nome, comecemos pelo nome, Adriana. 

Adriana Abreu Magalhães Dias formou-se como antropóloga na Unicamp. Concluiu a sua graduação em Ciências Sociais com a defesa de uma monografia baseada em uma pesquisa pioneira, no tema e na “área etnográfica": Os Anacronautas do teutonismo virtual: uma etnografia do neonazismo na internet (2005). Com um considerável conhecimento da deep web observou postagens não reconhecíveis ao leigo, as publicações dos neonazistas, e continuou assim a sua pesquisa para o mestrado (PPGAS, Unicamp) concluído com a dissertação intitulada Os Anacronautas do teutonismo virtual: uma etnografia do neonazismo na internet (2007). Finalmente, em 2018, defendeu a sua tese de doutorado: Observando o ódio:entre uma etnografia do neonazismo e a biografia de David Lane.

As suas pesquisas acadêmicas, monografia, dissertação e tese, são imprescindíveis para estudo das concepções e ações neonazistas e sobre pesquisas antropológicas na Internet. Quem faz antropologia neste campo de estudos no Brasil precisa necessariamente reconhecer seu pioneirismo e a importância de suas pesquisas.

Adriana é uma ativista, radicalizou os supostos de uma antropologia pública. Pelos seus artigos, pelos debates e ações jurídicas contra neonazistas. Pela coordenação do Comitê "Deficiência e Acessibilidade” da ABA, organizou também na ABA o I Seminário Nacional de Políticas Públicas para Mulheres com Deficiência, pela criação e realização de GTs relativos aos estudos sobre as pessoas com deficiência. Na elaboração do projeto de lei para o Dia Nacional das Doenças Raras.

Ao criar o Instituto Baresi, um fórum nacional associando “pessoas com doenças raras, deficiências e outros grupos de minoria” enfatizava a sua luta contra desigualdades e pela justiça. Não foi possível ainda me envolver pela evocação dos nossos momentos comuns.

Pela dor, mas também pelas centenas de testemunhos da vida e do trabalho e das ações políticas de Adriana que leio desde o dia vinte e oito de janeiro de 2023, quando foi anunciado o seu falecimento. Um mês depois de seu aniversário. Adriana não apenas pesquisou sobre e agiu contra as redes de neonazistas.

Criou um meshwork de afetos, tecido pelas suas lutas e pela sua generosidade. Onde quer que estivesse, no IFCH, Unicamp, em outras universidades, em reuniões científicas, em lugares aos quais era convidada a debates, no cotidiano, reivindicava condições de acesso aos portadores de deficiências, inclusive para si mesma.

Como li em algumas mensagens sobre ela, Adriana foi pioneira também nas reivindicações de acessibilidade nos ambientes acadêmicos e com uma qualidade própria, a de insistir nos problemas. Sensível esta relação entre os seus temas de pesquisa em antropologia, os de seus ativismos e entre estes e a sua vida, breve. Uma antropóloga, uma ativista. Acompanhei as suas pesquisas desde a monografia de graduação até o seu doutorado. Nos separamos no ativismo e nos aproximávamos intensamente nas leituras em antropologia, nas conversas sobre as suas pesquisas, e por um intenso afeto.

Quando Adriana concluiu o seu doutorado, tornei-me uma mensageira que endereçava a ela os tantos emails de jornalistas e movimentos por direitos humanos procurando-me para obter o seu endereço de e-mail. Pode-se dizer da vida de Adriana Abreu Magalhães Dias, que ela se fez distribuindo o bem e na procura da justiça. Que este seja o seu legado permanente.

Até sempre e obrigada, Adriana.