Simpósio Temático
Guerras e Alianças na História dos Índios:
Perspectivas Interdisciplinares

Coordenadores: John Monteiro (Unicamp), Maria Regina Celestino de Almeida (UFF) e João Pacheco de Oliveira (Museu Nacional-UFRJ)

Uma Atividade do XXIII Simpósio Nacional de História (ANPUH)
Londrina PR – 17 a 22 de julho de 2005

Resumos (ordem alfabética por nome do autor)

Almir Diniz Carvalho Jr., UFAM, Principais Indígenas na Amazônia Portuguesa. Resumo: Durante o século XVII e as primeiras décadas do século XVIII, na Amazônia portuguesa, surgiram líderes indígenas, conhecidos como principais, que foram forjados no contato entre as populações de diversas matizes étnicas e o mundo colonial português. Estes líderes, incorporados à dinâmica colonial, passaram a exigir do governo ibérico as recompensas prometidas em razão de terem se aliado à coroa lusa na luta contra outras nações da Europa que pretendiam se instalar naquela região. Para tanto, deslocaram-se, muitas vezes, até a Corte com este intuito. Esta comunicação trata sobre como estes índios incorporaram o papel de líderes, passando a negociar interesses individuais e de suas comunidades frente aos portugueses. Analisa ainda o papel de alguns deles nas guerras coloniais e a forma particular que estes conflitos foram resignificados por estes índios coloniais.

Antônio Brand, UCDB, Os Kaiowá e Guarani em Tempos da Companhia Mate Larangeira: Negociações e Conflito. Resumo: O trabalho, ainda em andamento, centra-se no estudo das relações entre os Kaiowá e Guarani e demais trabalhadores engajados na exploração dos ervais na região sul do atual Estado de Mato Grosso do Sul, durante o domínio da Companhia Matte Larangeira. A pesquisa apoia-se na análise da bibliografia, de documentos e, especialmente, de informações colhidas através da gravação de depoimentos com informantes indígenas e não-indígenas que participaram das atividade em foco. A Companhia Matte Larangeira, criada pelo Decreto Imperial No. 8.799 de 09/12/1882, explorou por mais de cinco décadas os ervais no território indígena. Embora ignorado por parte da produção acadêmica sobre esse período, houve, segundo os informantes, amplo engajamento dos Guarani e Kaiowá nos trabalhos da erva mate. Em regime de trabalho semi-escravo e constantes deslocamentos em busca de novos ervais, as relações alternavam-se entre a troca, por ferramentas e outros utensílios de interesse e relações de conflito, confronto e fuga.

Cleube Alves Silva, UFMS, Guerra como Estratégia: Contatos entre Akwen e Luso-Brasileiros na Capitania de Goiás. Resumo: Tínhamos no século XVIII na região tocantínia a divisão central dos povos de língua jê, do tronco macro-jê, os Akwen, que eram constituídos pelos grupos Xakriabá, Akroá, Xavante e Xerente. Os domínios dos Akwen abrangiam as duas margens do rio Tocantins no centro, sul e sudeste do atual Estado do Tocantins, estendendo-se ao sul do Piauí, ao oeste da Bahia e ao noroeste de Minas. Neste trabalho, que lança mão da etnohistória – um método multidisciplinar que possui elementos metodológicos da História, Antropologia, Arqueologia e, às vezes, Lingüística – pretendo apontar como os Akwen em um contexto de contato com o conquistador utilizaram-se da guerra como uma estratégia para o embate com os invasores de seu território. Apontamos como estes grupos indígenas estabeleceram alianças entre si e com os conquistadores dentro da dinâmica dos acontecimentos.

Edson Silva, UFPE, Índios no Nordeste: História e Memória da Guerra do Paraguai. Resumo: Os estudos recentes sobre a Guerra do Paraguai inovam pela superação das tradicionais ênfases no confronto bélico, nas descrições de batalhas ou biografias de heróis oficiais. As atuais abordagens procuram compreender as diversas fases do conflito, bem como os diferentes grupos sociais nele envolvidos. Assim como outros segmentos sociais, os povos indígenas no Nordeste também participaram da chamada "Grande Guerra". O que nos diz os registros documentais sobre isso? Qual a memória oral dos povos indígenas sobre o recrutamento? Qual a memória da guerra? E sobre o retorno e seus significados para a afirmação dos povos indígenas na região? São questões que nos propomos discutir nesse trabalho objetivando contribuir para o maior conhecimento da história indígena no Nordeste contemporâneo.

Eduardo Natalino dos Santos, USP, Conquista do México ou Queda de México-Tenochtitlán? Guerras e Alianças entre Castelhanos e Cidades Indígenas no Início do Século XVI. Resumo: Um dos episódios mais conhecidos da história da América é a derrota dos Mexicas para as tropas lideradas por Cortés em 1521. É a "Conquista do México", na qual, supostamente, todos os povos do Altiplano Central teriam sido submetidos ao domínio de Castela, marcando assim o início do cativeiro da "nação mexicana", que terminaria com a independência do México. O objetivo desta comunicação será mostrar que as guerras e alianças relacionadas à queda de México-Tenochtitlan não opuseram dicotomicamente castelhanos e indígenas e, tampouco, foram entendidas pelos povos locais como uma derrota geral. Procuraremos entender qual foi o alcance e impacto da queda de Tenochtitlan na rede política mesoamericana e como as tradições históricas locais a entenderam. Para isso, utilizaremos fontes produzidas por essas tradições: o Lienzo de Tlaxcala, o Códice Vaticano A, a Historia de la conquista (Cristóbal del Castillo) e o Livro XII da Historia general (informantes de Bernardino de Sahagún).

Elisa Fruhauf Garcia, UFF, A "Conquista" dos Sete Povos das Missões: de "Ato Heróico" dos Luso-Brasileiros a Campanha Negociada com os Índios. Resumo: Em 1801, os Sete Povos das Missões situados na margem oriental do rio Uruguai foram anexados ao território do Rio Grande de São Pedro, num processo que ficou conhecido como a "Conquista das Missões". Apesar desta "conquista" ser sempre analisada pelos historiadores a partir da ótica dos portugueses, que teriam sido os grandes responsáveis pela anexação, existem vários indícios que demonstram a participação dos índios nesta mudança de soberania. Descontentes que estavam com a administração leiga implantada pelos espanhóis nos seus povos após a expulsão dos jesuítas, em 1768, uma parte dos índios missioneiros pensou que seus direitos seriam melhor resguardados sob o governo português. Nesta comunicação, pretendo enfocar as motivações que levaram os índios a estabelecer uma aliança com os portugueses e, em que medida a população missioneira se aproveitou da rivalidade luso-castelhana para tentar fazer valer os seus interesses.

Estêvão Martins Palitot, UFPB, "Os Caboco não quer briga, os Caboco não quer guerra": Guerras Reais e Simbólicas dos Potiguara de Monte-Mór. Resumo: Os índios Potiguara de Monte-Mór, habitantes dos municípios de Marcação e Rio Tinto, na Paraíba, passam hoje por um processo de emergência étnica e reconquista territorial que envolve acirradas lutas judiciais, simbólicas e físicas através das quais reconstroem interpretações dos processos históricos que vivenciaram ao longo do século XX. O apagamento da identidade étnica nas terras da antiga sesmaria dos índios de Monte-Mór, após o estabelecimento da Companhia de Tecidos Rio Tinto e de um regime de terror provocado pelos vigias contratados pela empresa; a atual situação de degradação ambiental e disputas territoriais com as usinas de cana que adquiriram as terras da Companhia e a pouca acolhida que recebem dos órgãos indigenistas oficiais (FUNAI, FUNASA, etc.) e da sociedade em geral constituem o quadro histórico onde se processam as táticas de guerra e paz, efetivas e simbólicas, levadas adiante por este povo indígena.

Gabriel Passetti, USP, Participação Política, Guerra e Alianças entre Índios e Brancos na Argentina, 1852-1861. Resumo: Esta apresentação discute as relações políticas entre caciques indígenas e grupos políticos "brancos" durante o período em que a Argentina esteve dividida entre o governo da Província de Buenos Aires e o da Confederação (1852-1861). Participantes ativos na luta política do período, os caciques formularam proposta de defesa para suas terras e suas etnias, analisando os movimentos políticos entre os brancos para optarem no jogo de alianças. Paralelamente, ofereceram resistência aos avanços territoriais e absorveram o que entenderam como pontos positivos da "civilização". A partir da análise da correspondência indígena e militar, procura-se ultrapassar as dicotomias "civilizado e bárbaro", "superior e inferior", "estrategista e manipulado"; pelos tratados de paz é possível demonstrar a habilidade política dos caciques e as diversas maneiras pelas quais os grupos brancos entenderam estas importantes forças políticas.

Giovani José da Silva, UFG, Guerra e Aliança na História dos Kadiwéu: A Guerra do Paraguai (1864-1870) Rememorado pelos Índios. Resumo: Os Kadiwéu, remanescentes dos antigos Mbayá-Guaikuru, habitam atualmente o município de Porto Murtinho, Estado de Mato Grosso do Sul, na Reserva Indígena Kadiwéu. Contam os índios mais velhos que a área de aproximadamente 536.538 hectares da reserva (a maior do centro-sul brasileiro) foi conquistada graças à tenaz participação do grupo na Guerra do Paraguai (1864-1870). Problematizar a memória dos índios Kadiwéu sobre o conflito platino, buscando revelar como as guerras e as alianças são pensadas por eles, é o principal objetivo do artigo. As fontes utilizadas foram, sobretudo, relatos recolhidos por antropólogos e viajantes que entre os séculos XIX e XX conviveram com esses índios. Além disso, contou-se com a recente experiência do autor como professor dos índios Kadiwéu da aldeia de Bodoquena no recolhimento de versões contemporâneas da guerra, especialmente entre os mais jovens. Conclui-se que a memória da guerra, muito celebrada ao longo do século XX, é ainda hoje rememorada de diversas formas, por esta que já foi destacada no passado como uma sociedade de indígenas cavaleiros e guerreiros.

Hal Langfur, State University of New York-Buffalo, Colonos e Canibais na Mata Atlântica, Século XVIII. Resumo: Throughout the second half of the eighteenth century, a period during which Indians largely vanish from the historiography of colonial Brazil, violence between settlers and seminomadic indigenous peoples remained pervasive in the colony’s eastern forests, as effective conquest remained elusive. This paper contends that mutual brutality, far from marking the absence of interethnic exchange, constituted a primary mode of cultural commerce. Settlers, soldiers, and Indians learned and appropriated the rules and techniques of barbarous conduct from one another, according to fear-ridden assumptions about their respective frontier adversaries. Warring parties, in short, found in terror an essential language of contact and communication.

Izabel Missagia de Mattos, UCGO, Missão Religiosa e Violência: o Caso de Alto Alegre, 1901. Resumo: O episódio sangrento do massacre de quatro missionários capuchinhos lombardos e sete missionárias italianas durante a missa dominical, ocorrido em 1901 na missão de Alto Alegre – fundada no início da República para a "civilização" das "cidadelas da barbárie" indígenas situadas nas matas do centro do Maranhão – constituiu o emblema de uma revolta de amplas dimensões, cujas repercussões ainda hoje se fazem sentir nas relações de hostilidade existentes entre os Guajajara e a população regional. A comunicação visa situar o evento no âmbito do indigenismo coetâneo, buscando também reinterpretá-lo de acordo com as leituras realizadas atualmente pelos próprios nativos. A pesquisa baseou-se em fontes diversificadas, como notícias veiculadas pela imprensa regional, cartas e relatos dos missionários e registros ainda existentes na memória social.

James Emanuel Albuquerque, UFRJ, Relação da Viagem ao País dos Tapuias: uma Leitura. Resumo: John Monteiro apontou, já há algum tempo, para a necessidade da releitura de documentos coloniais capaz de produzir um "renovado retrato da participação das populações indígenas diante do avanço dos europeus". Como tema da monografia do bacharelado, desenvolvi para a crônica de Roulox Baro, Relação da Viagem ao País dos Tapuias um "comentário de texto histórico", buscando indícios que ajudassem a traçar uma nova interpretação de um dos processos históricos constitutivos das experiências indígenas no Brasil colonial. Esta comunicação pretende apresentar um resumo deste trabalho cujos resultados inspiraram a escolha do tema de nossa pesquisa, em andamento, sobre os "Tapuias do sertão nordestino" na visão dos cronistas que se debruçaram sobre a presença holandesa no Nordeste do Brasil no século XVII.

Jorge Eremites de Oliveira, UFMS, e Levi Marques Pereira, UFMS, "Duas no Pé e uma na Bunda": da Participação Terena na Guerra entre o Paraguai e a Tríplice Aliança à Luta pela Ampliação dos Limites da Terra Indígena Buriti. Resumo: Este trabalho analisa a participação Terena na guerra entre o Paraguai e a Tríplice Aliança (1864-1870), suas conseqüências no processo de desterritorialização e reterritorialização e suas significações no movimento pela ampliação dos limites da Terra Indígena Buriti, localizada em Sidrolândia e Dois Irmãos do Buriti, MS. As pesquisas realizadas fazem parte de uma perícia judicial concluída por meio de observação participativa e análise de fontes arqueológicas, etnohistóricas e etnológicas. Constatou-se que após a guerra e com o advento da República, o governo central transferiu terras indígenas não tituladas para o Estado de Mato Grosso. Este, por sua vez, apoderando-se delas e desconsiderando a legislação em vigor, declarou-as como terras devolutas para depois as repassar a terceiros, os quais promoveram esbulho contra comunidades indígenas com o apoio de agentes do governo. Ao analisar essa situação, uma liderança de 85 anos argumentou que os Terena receberam do Governo Imperial apenas três botinas por lutarem ao lado do exército brasileiro contra as tropas paraguaias: "Duas no pé e uma na bunda".

José Sávio Leopoldi, UFF, A Guerra Implacável dos Munduruku: Elementos Culturais, Sociais e Ambientais Alicerçados na Caça aos Inimigos. Resumo: Salvo por óbvias disputas pela exploração do meio ambiente – não muito comuns entre os indígenas brasileiros dada a vasta extensão territorial do país – as verdadeiras razões das guerras entre os silvícolas constitui uma questão que deve merece maior atenção. Mesmo no caso dos belicosos Munduruku, além de descrições dos ataques aos inimigos, do valor atribuído aos guerreiros, do objetivo imediato da guerra – a caça às cabeças – e das festas em torno do enfeite dessas peças necessárias às atividades de caça, coleta e de agricultura, a "razão beligerante" da tribo permanece pouco explorada. Nossa proposta é considerar a guerra como o elemento central da vida Munduruku, constituindo a verdadeira teia de significados, onde se ancoram os valores culturais por excelência do grupo, bem como os elementos básicos da sua organização social. Independentemente de vinganças, de ataques e de qualquer outro motivo "justo", a guerra tinha que acontecer para os Munduruku: a vida da tribo dependia da morte dos inimigos. Nossa hipótese é que uma explicação de base darwinista pode explicar mais coerentemente essa radical "necessidade" da guerra perpetrada pelos Munduruku.

Juciene Apolinário, UNITINS, O Povo Akroá e suas Práticas de Guerra e Aliança na Fronteira do Sertão do Século XVIII. Resumo: Em uma perspectiva interdisciplinar histórico-antropológica, mergulha-se na história dos Akroá no período setecentista, grupo indígena pertencente à família jê e língua timbira. A partir dos primeiros contatos com os conquistadores no sul do Piauí e no norte de Goiás, procurou-se resignificar as práticas políticas dos Akroá diante da política indigenista portuguesa, os papéis das suas lideranças e, especificamente, o sentido da guerra e da aliança. O principal elemento da cultura Akroá, identificado nos documentos arrolados para a pesquisa, foi a ação contínua de guerra que para esse grupo indígena poderia ter tido uma conotação não só de defesa territorial, mas também um caráter de "vingança". No desenvolvimento da pesquisa verificou-se que a plasticidade da política indígena dos Akroá podia definir inimigos tradicionais e delimitar os novos, reafirmando os seus papéis históricos a partir das contínuas ações de guerras.

Leandro Mahalem Lima, USP, A Multiplicidade da Guerra Cabana: Notas sobre os Atores Indígenas. Resumo: Este trabalho, situado na interface da etnologia ameríndia com a historiografia brasileira, pretende utilizar-se de métodos e perspectivas de ambas as disciplinas para o empreendimento de uma análise que nos possibilite compreender estratégias, procedimentos e motivações políticas, no seio da Cabanagem, desenvolvidas por atores indígenas. Apesar de a presença nativa neste expressivo movimento social da história brasileira – ocorrido na década de 30 do século XIX, na Província do Pará – ter sido ampla e intensa, ainda hoje pouco se sabe acerca de suas atuações e de seus interesses particulares. A pesquisa parte de uma crítica aos modelos monolíticos, que fundamentaram os diversos matizes historiográficos tradicionais que se debruçaram sobre o tema, para evidenciar a multiplicidade tensa e contraditória de interesses políticos em jogo na Cabanagem, bem como a necessidade de uma análise de situações específicas e localizadas.

Lodewijk Hulsman, UVA, Antônio Paraupaba e a Aliança Potiguar-Holandesa. Resumo: Frei Manoel Calado escreveu no seu Valoroso Lucideno: "Assim que os malvados, e ingratos índios pitiguares, e tapuias foram a causa, e o principal instrumento de os holandeses se apoderarem de toda Capitania de Pernambuco, e de a conservarem tanto tempo". Cristina Pompa (2003), Marcos Galindo (2004) e Mark Meuwese (2004) estudaram a reação dos povos indígenas na intrusão européia do Brasil. Uma fonte importante para esses estudos é a documentação do Brasil Holandês. A proposta explora as implicações da pesquisa nova para a historiografia da aliança potiguar-holandesa usando o texto de Antônio Paraupaba como guia. Antônio Paraupaba viajou três vezes para os Países Baixos. A primeira viagem foi com seu pai em 1625, depois voltou com uma embaixada indígena em 1644 e a terceira vez foi em 1654. Nesse ano dirigiu um requerimento para os Estados Gerais, o governo da República Neerlandesa. Paraupaba consegui um posto no exército neerlandês e volta para Haia em 1657 para fazer um segunda Remonstrantie (representação ou memorial). Os textos das Remonstranties foram publicados como panfleto em 1657. Pedro Souto Maior editou uma tradução parcial do panfleto em 1913, o que ficou como um dos textos indígenas mais citados. O texto de Paraupaba faz parte de um acervo de textos indígenas que o Brasil holandês deixou. A alfabetização indígena, em português e neerlandês é um fenômeno pouco comentado: temos esses documentos porque os arquivos da Companhia das Índias Ocidentais (WIC) os resgataram ou porque existia uma alfabetização indígena excepcional? Os estudos de Galindo e Pompa mostram que a divisão tupi-tapuia deve ser tratado com cuidado. Falta um mapeamento indígena do Brasil holandês; o regedor Carapeba, por exemplo, ficou desconhecido até há pouco tempo. Pelas agregações pode se identificar o movimento da população indígena e pesquisar a dimensão pan-americana da aliança potiguar-neerlandesa sugerida por Meuwese. Este autor argumenta e documenta que Paraupaba fazia parte de um movimento "brasileiro" para reivindicar direitos civis dentro do Brasil holandês e que a participação administrativa dos "brasileiros" contrasta com a política indígena da WIC na América do Norte. Assim o texto é um exemplo do envolvimento ameríndio na política dos Países Baixos. Parece que a aliança com os neerlandeses é caracterizada pela presença constante de índios brasileiros nos Países Baixos durante os anos 1625-1658. A exploração termina com uma projeção sobre como a metodologia utilizada por Pompa e Galindo pode ser aplicada para um melhor entendimento da significação da aliança potiguar-neerlandesa para o universo indígena do Brasil.

Lúcio Tadeu Mota, UEM, Relações Interculturais na Bacia dos Rios Paranapanema e Tibagi no Século XIX. Resumo: Os povos indígenas Guarani e Kaingang que ocuparam as bacias dos rios Paranapanema/Tibagi, sustentaram, com diversos tipos de ações, suas presenças nos seus antigos territórios. Os acontecimentos históricos ocorridos na região no século XIX estão marcados por ações políticas desenvolvidas por essas populações. Essas ações ultrapassaram o simples embate dicotômico índios versus brancos, e nos revelam complexas formulações e estratégias utilizadas pelos diversos sujeitos na conquista de seus objetivos. Nesta perspetiva apresentaremos aqui a história da presença dos Guarani e Kaingang nos rios Paranapanema e Tibagi, bem como as estratégias e ações políticas dessas populações para conquistar, manter ou reconquistar seus antigos territórios.

Lucybeth Arruda, UFMT, Cartografia da Disciplina nos Postos de Atração em Mato Grosso. Resumo: A abertura dos sertões e a redefinição territorial do início do século XX faziam parte de um programa nacional de consolidação do Brasil enquanto estado soberano. Neste contexto estava inserido o papel do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) que desempenhava ações que representavam a inserção efetiva do progresso, contribuindo para a povoação de novas frentes de colonização e freando os conflitos entre colonizadores e povos indígenas, a partir da localização desses índios e da instalação de postos de "reeducação", na direção da tão sonhada civilização. Nesta comunicação, pretendo localizar os aldeamentos criados entre 1911 e 1920 e relatar as investidas de pacificação das etnias nos sertões de Mato Grosso. Nos relatos, identificaremos as estratégias dos agentes do SPI que utilizavam técnicas de geopolítica. A política indígena caracterizava-se por um discurso de inclusão a partir do controle e por orientações disciplinares, que determinavam ações que substituíam a guerra aberta por uma outra, que se dava sob outros termos.

Maria Aparecida de Araújo Barreto Ribas, UFF, Edificando sobre Fundamento Alheio: A Catequese Calvinista no Brasil Holandês (1630-1654). Resumo: Trata-se de problematizar o processo de catequese indígena desenvolvida pelos missionários da Igreja Cristã Reformada no Brasil holandês. Considerando que, quando os missionários desta Igreja iniciaram seu projeto catequético, havia já em curso praticamente um século de catequese indígena pelas ordens religiosas da Igreja Católica Romana; considerando, ainda, as várias concordâncias e discordâncias práticas e teológicas entre a Igreja Cristã Reformada e a Católica Romana, ambas portadoras da mesma simbologia religiosa da Europa medieval e renascentista, muitas questões se colocam quanto à (re)catequese calvinista dos "gentios" nos trópicos. Dentre tais questões, talvez a de maior importância e que pretendo discutir neste trabalho é a questão da tradução: a tradução de tradições, ou seja a transposição para o vocabulário indígena da mensagem do Deus cristão da Igreja Cristã Reformada. Cabe, ainda, ressaltar que tal evangelização e a adesão de muitos índios ao protestantismo esteve intimamente associada, direta ou indiretamente, à dinâmica dos conflitos coloniais, no caso aqui o conflito luso-holandês.

Maria do Carmo Sampaio Di Creddo, UNESP, Política de Aldeamentos e Bandeiras: Vale do Paranapanema (Segunda Metade do Século XIX). Resumo: O objetivo da pesquisa consiste, através da análise de fontes oficiais, tais como os Anais da Assembléia Provincial (SP, 1857), os Ofícios Diversos (Capital/Índios, 1861-73), os Relatórios de Presidentes da Província e a Repartição das Terras Públicas (Arquivo do Estado de SP), em discutir o complexo e violento processo de formação da grande propriedade as relações do grande proprietário com o governo provincial, com o objetivo de elaborar estratégias de destruição física e cultural dos indígenas.

Maria Hilda B. Paraíso, UFBA, Guido Pokrane: O Imperador do Rio Doce. Resumo: Guido Pokrane, afilhado do Comandante das Divisões Militares de Minas Gerais na primeira metade do século XIX, é um dos personagens centrais nas relações de guerra e paz entre os "Botocudos" e a sociedade dominante. Nas décadas de 1820 e 30 atuou como agente transcultural a serviço dos comandantes das divisões. Após a morte de Guido Marlière, afastou-se do convívio com os militares, criou seu aldeamento autônomo. Ante a pressão para dominá-la, procurou o Imperado no Rio de Janeiro de onde retornou com o título de Imperador. Terminou assassinado em seu aldeamento.

Maria Idalina Pires, UFPE, Resistência Indígena nos Sertões Nordestinos no Pós-Conquista Territorial. Resumo: Esta pesquisa (que se refere à tese de doutorado com o mesmo título defendida em 2004) procura rediscutir o processo de resistência de alguns povos indígenas no sertão da Capitania de Pernambuco e suas anexas, no período do pós-conquista territorial, que abrange a segunda metade do século XVIII e início do século XIX (1757 a 1823). Através do levantamento e análise da documentação deste período, bem como a partir de uma crítica historiográfica, procura explicar como esses povos sobreviventes das várias guerras de extermínio impetradas pelo colonizador conhecidas genericamente por "Guerra dos Bárbaros" (1650 a 1720), continuaram a resistir. Propõe reconstruir as várias formas de ação e reação desses povos ao colonialismo (conflito-guerras/negociação-alianças) a partir da fase pombalina, buscando compreender como agiram e reagiram à transformação dos seus aldeamentos em vilas. Essas são entendidas como um espaço singular de estudo sobre as relações entre indígenas e a sociedade colonial e por isso implicavam não apenas em um locus de subordinação, mas também de resistência. Mostra ainda como esses povos conviveram com as demais forças sociais, isto é, colonos, bandeirantes, missionários, diretores e com o Estado – suas instituições, leis e decretos. Neste sentido usou-se como baliza para delimitação cronológica inicial da pesquisa a implantação do Diretório (1757), já que representava o principal marco legal da ação do Estado pombalino referente às populações indígenas, passando pela versão adaptada do "Diretório do Maranhão" (a "Direção com que interinamente se devem regular os índios das novas vilas e lugares eretos nas aldeias da Capitania de Pernambuco e suas Anexas) – datada de maio de 1758 – até sua extinção, em 1798, indo finalizar no ano de 1823 (ano de criação da proposta de José Bonifácio de Andrada e Silva, "Apontamentos para a civilização dos índios bravos do Império do Brasil"), quando o Império se firma como forma de governo independente.

Maria Leônia Chaves Resende, UFSJ, Entradas e Bandeiras nas Minas dos Cataguases. Resumo: Esta comunicação trata das expedições que adentraram o interior de Minas Gerais, ao longo do século XVIII, em consonância com a política indigenista dos governantes coloniais. Procura analisar o embate travado entre colonos e indígenas em função da apropriação das terras – que se tornou uma das mais significativas riquezas dos entrantes – bem como a contrapartida indígena que acionou a justiça colonial para garantir a prerrogativa legal de direito à terra.

Mariana Campos Françozo, Unicamp, Os Índios no Brasil Holandês. Resumo: O tema central deste trabalho é a história indígena no período do Brasil Holandês (1630-1654). A chamada "invasão holandesa" foi foco de diversos estudos na historiografia brasileira, porém nenhum deles se aprofundou propriamente na questão da atuação indígena neste episódio. O objetivo deste trabalho, portanto, é problematizar as interpretações disponíveis sobre este período da história do Brasil. Para tal, o texto se dividirá em três partes: em primeiro lugar, faremos um balanço da historiografia sobre o tema, pontuando sua abordagem da história indígena; em seguida, apresentaremos as fontes primárias disponíveis, tanto no Brasil quanto no exterior; finalmente, elaboraremos uma série de questões que podem ser feitas a este material a partir da perspectiva antropológica, procurando desta forma lançar luz sobre a complexidade das relações travadas então bem como identificar novas interpretações possíveis para as alianças transculturais e as mudanças por elas engendradas.

Marli Auxiliadora Almeida, UNEMAT, A Pacificação dos Bororo Coroado na Prov. de Mato Grosso: "Guerras e Alianças" (1845-1887). Resumo: Este texto apresenta o resultado do contato entre os Bororo Coroado e a sociedade mato-grossense, na segunda metade do século XIX. Tidos como selvagens e bravios, os Coroado, eram considerados pelos governantes como um dos principais empecilhos para o desenvolvimento da Província. Visando atraí-los para o "grêmio da civilização" se pôs em prática diversas medidas levadas a cabo pelas chamadas "expedições pacificadoras". Aqui se analisa as práticas de "guerra e paz", que resultou na "pacificação" dos Coroado, nas narrativas do etnólogo Karl von den Steinen e o do representante do governo provincial, Alferes Antônio José Duarte.

Marta Maria Lopes, UFMT, A Catequese dos Índios em Mato Grosso e as Relações com o Exército Brasileiro no Século XIX. Resumo: Um levantamento de dados no Arquivo Público de Mato Grosso, com aproximadamente 100 documentos, nos mostrou que o Diretório Geral dos Índios, no século XIX, permitia que os capitães de aldeias fundadas pelos não-índios ou assumidas por eles, recebessem patentes militares. Inferimos dessa atitude que esse índio então já estaria "civilizado", "manso", pois esse era o objetivo do referido Diretório: trazer os índios à civilização, preferencialmente sem usar de meios violentos. Nesse volume documental também encontramos informações sobre as relações entre os militares dos fortes de Coimbra, Casalvasco, Presídio de Miranda e Destacamento de Albuquerque e os índios em torno. O que nos saltou aos olhos é que o Diretório Geral dos Índios e essas instituições militares não demonstram a presença ou existência um do outro no âmbito das questões com índios que relatam. Nosso objetivo é aprofundar o levantamento de dados relativos à questão da militarização dentro dos aldeamentos do século XIX e suas relações com o exército brasileiro que estava em formação.

Mary Karasch, Oakland Univ., Guerra Indígena e Alianças Interétnicas na Capitania de Goiás. Resumo: This paper will describe how the indigenous peoples fought the invaders of their lands and document alliances they made both with the governors of Goiás and against them. The objective of the paper is to document resistance strategies that involved both warfare and temporarary alliances with the colonial power. Indigenous peoples to be discussed include the Apinayé, Karajá, Xerente, Xavante, Avá-Canoeiro, and Kayapó of the late colonial period.

Neimar Machado de Sousa, UFMS, Conflitos e Alianças entre Índios Guarani, Jesuítas, Bandeirantes e Encomenderos no Itatim. Resumo: Esta comunicação centra-se na temática das missões jesuíticas, especificamente, as que se estabeleceram no Itatim. Nesta região, os jesuítas foram os arautos do colonialismo europeu ao estabelecer suas reduções entre 1631 e 1659: Santo Inácio de Caaguaçu e Nuestra Señora de la Fé. A perspectiva da pesquisa passa por breve análise da bibliografia já produzida sobre este tema e do estudo da documentação colonial como elementos que podem esclarecer pontos importantes sobre os embates entre a colonização portuguesa e espanhola nesta região e o papel das populações indígenas que aí se encontravam no século XVII. Uma história do Itatim, sob esta ótica inclui o estudo dos conflitos internos que aconteciam nas aldeias devido às inúmeras parcialidades étnicas presentes na região. Outra possibilidade de abordagem centra seu foco sobre a ação catequética da Companhia de Jesus e a resistência indígena organizada pelos xamãs, além da disputa entre encomenderos, bandeirantes e colonos pela mão-de-obra indígena e os inúmeros motivos que impulsionavam os assaltos a estas missões.

Niminon Suzel Pinheiro, Terra não é Troféu de Guerra. Resumo: A ocupação do Oeste Paulista ocorreu por volta da segunda metade do século XIX e meados do século XX. Diferente do que os documentos oficiais procuraram demonstrar, essa ocupação pode ser caracterizada por um tipo de guerra declarada pelas forças do poder público e privado contra os povos nativos dessa região. A invasão dos territórios dos povos nativos (Kaingang, Guarani e Oti) foi possível graças às alianças de interesses entre diferentes agentes da sociedade dita civilizada, alianças essas que possibilitaram aos latifundiários, suas cidades, seus animais e plantas desalojarem os indígenas, os animais selvagens e as plantas nativas, configurando a depredação ambiental hoje verificada, mas prevista ou anunciada pela resistência de alguns grupos indígenas como também pelo geógrafo Pierre Monbeig.

Regina Célia Gonçalves, UFPB, Os Potiguara na Guerra dos Brancos (1630-1654). Resumo: O trabalho coloca em discussão o papel representado pelo povo Potiguara durante o período de "ocupação holandesa" na área, então conhecida, como Capitanias do Norte, entre 1630 e 1654. Tomando, como ponto de discussão, as trajetórias de dois dos líderes Tupi envolvidos na luta – Pedro Poty, aliado dos holandeses, e Felipe Camarão, aliado dos portugueses – procuramos demonstrar que, pela primeira vez, desde que suas terras ancestrais foram invadidas e conquistadas pela sociedade colonial, os Potiguara, divididos, participam da guerra em campos opostos. Segundo nossa perspectiva, essa divisão teve suas raízes fincadas nos episódios ocorridos, em 1625, na Baía da Traição, quando os Potiguara sofreram sua definitiva derrota diante dos portugueses, mas "costuraram" uma aliança, ainda que débil, com os holandeses. Superando a perspectiva historiográfica que apreende os povos indígenas como vítimas ou marionetes dos brancos na sociedade colonial, procuramos demonstrar que a participação dos Potiguara no conflito luso-holandês insere-se na lógica da sua tradição ancestral de guerra, que os fizera conhecidos, desde o século XVI, como o "maior e mais guerreiro gentio do Brasil".

Renato Pereira Brandão, As Relações Étnicas na Conquista da Guanabara. Resumo: Devido à importância da Cidade do Rio de Janeiro, a sua história tem sido alvo de diversos estudos. Predomina, em nossa historiografia, a versão de que foi um feito do navegador florentino América Vespúcio a descoberta "portuguesa" da Baía de Guanabara. Posteriormente, foi ela ocupada pelos franceses, com a intenção de aí fundar uma nova colônia, a França Antártica, onde pudessem conviver, de forma pacífica, católicos, protestantes e índios. Contudo, a coroa de Portugal impediu a realização deste "ideal utópico", ao expulsar da Guanabara os franceses e seus aliados tupinambás. Para garantir a posse da região, Estácio de Sá funda aí uma nova cidade, que surge, assim, em decorrência da vitória do interesse mercantilista luso frente ao ideal "humanista" francês. O objetivo deste trabalho é apontar as contradições e incoerências presentes nesta versão histórica, procurando levantar discussões sobre a aliança dos franceses com os índios, o significado da elevação de um simples núcleo urbano à condição de cidade e, por conseqüência, o surgimento de uma nova capitania em terras que estavam sob os domínios dos donatários da Capitania de São Vicente.

Ricardo Pinto Medeiros, UFPB, Bárbaras Guerras: Povos Indígenas nos Conflitos e Alianças pela Conquista do Sertão no Período Colonial. Resumo: O presente trabalho pretende analisar a política de alianças e guerras entre a coroa portuguesa e os povos indígenas no sertão nordestino no período colonial. Os conflitos foram agrupados em três grandes regiões: o sertão do Recôncavo Baiano e a margem baiana do rio São Francisco, incluindo o extremo sul do Piauí; o sertão das capitanias de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande e Ceará; e o sertão das capitanias do Piauí e Maranhão. Este agrupamento correspondeu, grosso modo, à seqüência temporal na qual os conflitos adquirem maior densidade na documentação pesquisada e permitiu visualizar melhor como se deu a movimentação dos povos a partir do contato e quais as conseqüências para os mesmos.

Silvana Alves de Godoy, Unicamp, Índios e Bandeirantes na São Paulo Colonial. Resumo: Este trabalho analisa a trajetória de membros da família Fernandes, habitantes da capitania paulista, entre finais do século XVI e meados do século XVII. Descendentes dos primeiros colonos brancos do planalto paulista, os Fernandes, além de dominarem os negócios de trigo na vila de Parnaíba, foram fundadores das vilas de Itu e Sorocaba. Assim, por meio de inventários, testamentos e contrato de dote de membros desta família, é possível analisar aspectos mais gerais daquela sociedade: a ocupação do planalto, as estratégias de apresamento e a importância da mão-de-obra indígena para a economia paulista seiscentista, o relacionamento entre senhores e índios. Neste sentido uma biografia familiar demonstra as estratégias de formação e consolidação de uma elite local.

Tarcisio Glauco da Silva, UFES, Junta de Civilização e Conquista dos Índios e Navegação do Rio Doce. Resumo: Esta comunicação pretende apresentar os resultados parciais de pesquisa realizada para o Programa de Pós-Graduação em História da UFES. Essa Junta Militar, criada por Carta Régia do Príncipe D. João em 13 de maio de 1808, tinha por objetivo a guerra contra os índios Botocudos e a abertura da região leste da Capitania de Minas Gerais a fim de integrá-la política, social e economicamente ao restante da Capitania. A discussão se baseia na apropriação de espaços, conquista de territórios, conflitos étnicos, diferenças de temporalidades e organização social de índios e luso-brasileiros. Há também a pesquisa sobre livros de atas (documentos, até onde sabemos, inéditos) que retratavam parte da rotina da citada Junta Militar.

Teresinha Marcis, UESC, O Exercício do Poder em uma vila Indígena: Olivença-BA, 1824-1889. Resumo: O trabalho aborda o exercício do poder na Vila Nova de Olivença, caracterizada como indígena e com uma estrutura administrativa mista: a Câmara dos Vereadores e a Diretoria dos Índios. Focaliza-se, com base nos documentos produzidos no período de 1824-1888, a atuação ambígua dos vereadores, juizes e diretores, a elite dirigente local, composta por moradores indígenas, mestiços e portugueses – proprietários, arrendatários, funcionários do governos e comerciantes. O confronto de interesses diversos e até antagônicos em relação ao controle da mão-de-obra indígena, das terras e das rendas, induzia a formação de alianças entre moradores índios e portugueses, estrategicamente manipuladas nas eleições para a câmara e juizes. Essa complexidade pode ser visualizada nos conflitos com proprietários que se instalavam, na vila e arredores, em número crescente a partir do incremento da atividade extrativa de madeira e piaçava (1860). Em todos esses conflitos, a questão da identificação indígena da vila se manifesta como foco central e como estratégia de negociação e formação de alianças.

Thereza Martha B. Presotti, UFMT e UNB, A Conquista dos Sertões do Cuiabá e Mato Grosso: os Numerosos Reinos de Gentios e a "Guerra Justa" aos Paiaguá (1719-1748). Resumo: Numerosos "reinos" ou sertões de gentios foram devassados no processo da conquista colonial da parte central da América do Sul. De ocupação imemorial por sociedades ameríndias, nas primeiras décadas do século XVIII, sertanistas paulistas apresadores de índios denominam esta grande região como os "Sertões do Cuiabá", em referência ao rio Cuiabá, afluente do rio Paraguai. O ano de 1719 é o marco inicial do processo da conquista, pois é quando se descobre o ouro. Nesta comunicação focalizo a fase inaugural da conquista dos sertões e minas do Cuiabá e do Mato Grosso: as três primeiras décadas do século XVIII, sob a jurisdição da Capitania de São Paulo (1719-1748). Pretendo retomar as narrativas de sertanistas, cronistas e monçoeiros, aspectos das visões impressas nesta historiografia, o que viam e como apresentaram os "índios", tratados quase sempre de gentios. Destaco a "guerrra justa" aos Paiaguá (1734) onde procuro analisar este confronto diante das complexas disputas entre os paulistas, os Bororos e os referidos Paiaguá e os portugueses e espanhóis.

Vania Losada Moreira, UFES, Guerra e Paz no Espírito Santo: Caboclismo, Vadiagem e Recrutamento Militar século XIX. Resumo: Na historiografia sobre a América Latina, o recrutamento forçado para o serviço militar tem sido identificado não apenas como um meio de garantir ao Estado os efetivos de soldados, mas também como um importante instrumento de controle social e de coerção ao trabalho, já que, freqüentemente, recai sobre as populações consideradas "vadias" e/ou "perigosas". Menos conhecido, no entanto, é o impacto do recrutamento entre as populações indígenas brasileiras durante o Império, embora as evidências históricas demonstrem que os índios foram, desde o período colonial, objeto dos cálculos estratégicos de guerra e paz do estado. Na presente comunicação, pretendemos discutir o recrutamento militar entre as populações indígenas da Província do Espírito Santo. Trabalhamos com a hipótese de que, além de ter sido um meio de controle social e de coerção ao trabalho, o recrutamento militar entre os indígenas da Província também funcionou como um mecanismo de integração forçada à ordem social dominante.

Vera Lúcia Vargas, UCDB, Os Índios Terena e a Guerra do Paraguai. Resumo: Esse trabalho tem por objetivo demonstrar alguns dos momentos da participação dos índios Terena na guerra contra o Paraguai (1864-1870), no então sul de Mato Grosso (atualmente Mato Grosso do Sul) e a sua capacidade de reconstrução dos antigos territórios que ocupavam nessa região, por meio da apropriação de sua participação na referida guerra, pois com o seu término acentuou-se a sua desterritorialização, com o início da formação das fazendas e a necessidade do governo brasileiro incentivar e legalizar o povoamento por não índios nessa região. Diante desse contexto, os Terena passaram a interagir com a política governamental, por meio de sua participação na mencionada guerra, ou seja, prestando serviços para as autoridades, e depois se apropriando dessa situação e a transformando em um mecanismo de provocação de sua territorialização, no início do século XX.

Yobenj Aucardo Chicangana Bayona, FEUC-CEPOPE, Aliados na Guerra: Os Índios do Brasil Holandês nas Telas de Albert Eckhout (1641-1643). Resumo: Em sua estadia no Brasil na primeira metade do século XVII (1637-1641), o artista Albert Eckhout (c. 1610-1665), da corte do Conde Johan Maurits van Nassau-Siegen, pintou figuras de nativos, vegetais, animais e naturezas-mortas. Destaca-se, entre elas, um grupo de oito telas grandes de homens e mulheres, estabelecendo uma tipologia dos habitantes do Brasil. Para o caso desta comunicação interessam as telas dos casais Tupi e Tapuia pintados entre 1641 e 1643. As telas de Eckhout sobre os índios Tupi e Tapuia abandonam os cânones renascentistas de beleza idealizada, inaugurando uma época em que a imagem mais descritiva e naturalista com ênfase no exótico vai se impor como modelo nos registros dos viajantes. Entretanto, não é possível separar o que se "vê" (olhar) do que se "sabe" (experiência). Ainda que o artista possua técnicas sofisticadas, como o uso da perspectiva, o domínio das cores, a habilidade nos detalhes, ferramentas para representar o mundo natural, fica evidente que "redutos de convenções" faziam com que um artista como Eckhout aplicasse fórmulas iconográficas aprendidas um século antes ao invés de se apoiar completamente na observação direta do natural para pintar suas telas.