XXIV Simpósio Nacional de História

São Leopoldo, RS – 15-20 de julho de 2007

Simpósio Temático “Os Índios na História: Fontes e Problemas”

 

Coordenadores:

John M. Monteiro, UNICAMP (johnmm@unicamp.br)

Maria Regina Celestino de Almeida, UFF (reginacelestino@uol.com.br)

 

 

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Resumos (ordem alfabética)

 

1.     Ádria Borges Figueira Cerqueira, UFG (mestranda). Narrativas Tapuias: a construção do passado, do nós e dos outros. Com ênfase no processo histórico de ressurgimento de grupos étnicos no cenário nacional e de afirmação de uma pluralidade de identidades em um contexto global nas últimas décadas, tem-se como proposta compreender através das narrativas como os Tapuios do Carretão articulam sua visão de mundo e suas experiências em um momento em que o grupo vivenciou uma situação traumática de negação de sua identidade e de direitos adquiridos. As problemáticas apontadas ao longo dessa pesquisa dizem respeito a uma delimitação temporal que abrange a década de 1980, em que o grupo tratou de buscar estratégias que validassem sua reivindicação pelo reconhecimento étnico. Nesse contexto a memória coletiva adquire uma grande relevância, pois trata de formular uma problematização capaz de levar ao entendimento dos fatores presentes nas narrativas orais registradas. A pretensão de investigar a constituição das narrativas no processo que visava o reconhecimento da identidade e de direitos, se ampara na e pela historicidade desse grupo indígena do estado de Goiás, na relação desses sujeitos com o tempo e o espaço. Nessa pesquisa, o uso da narrativa como estratégia usada pelo grupo, que foi registrada na década de 1980 torna-se fonte significativa.

2.     Almir Antonio de Souza, UFSC (doutorando). Vida, Trabalho e Morte: a história social da caça e apresamento dos Xokleng e seus caçadores na selva sul-brasileira (1850-1950). O texto procura pontuar algumas questões relevantes à complexidade social vivida por colonos, Xokleng, e caboclos durante os sangrentos embates entre bugres e seus caçadores quando do processo de colonização e ocupação da selva ao sul do Brasil, desencadeado pela imigração e conseqüente desejo do governo brasileiro em invadir as terras habitadas pelos povos indígenas, desejo que alcançado concorreu diretamente no desaparecimento de grupos étnicos em um extenso território catarinense, e boa parte dos vizinhos estados. Durante quase todo o século XIX e já bem adiantado o XX, enquanto se estabeleciam às cidades, e as vias de ligação entre elas, os indígenas foram submetidos a um processo de invasão, extermínio e escravidão, resultando numa situação presente, de alguns restantes descendentes dos sobreviventes e “sobreviventes”, confinados em poucas reservas em Santa Catarina. Uma das investigações que aqui iremos proceder vai de encontro à premissa de que no Brasil, a ocupação da terra, com a expulsão e domínio sobre as populações nativas, não sofre soluções de continuidade, tem suas permanências no contemporâneo, e como tal deve ser avaliado e desmontado como esquema perverso de eliminação étnica.

3.     Almir Diniz de Carvalho Jr., UFAM (professor doutor). O Mundo Gentílico no Mundo Cristão: confrontos e diálogos. No mundo colonial amazônico um conjunto de práticas culturais de caráter diverso subsistia através do diálogo e do confronto de significados. Esta comunicação procura destacar algumas delas. Elas eram mantidas pelas populações indígenas evangelizadas, alicerçadas em suas tradições, mas reinventadas num contexto novo. O confronto de significados se evidencia na medida em que foram lidas, registradas e representadas pelos missionários católicos e pelos funcionários da inquisição de Lisboa, vinculando-as às heresias. De outra forma, o diálogo se fazia presente na medida em que eram resignificadas e compartilhadas por grupos de origem cultural diversa, incluindo a população colonial de origem européia e mestiça, negros de origem africana e a população indígena oriunda de etnias diversas.

4.     Carla Berto, PUC-RS (mestre). Milagres e Indígenas em Perspectiva: autores, personagens e circunstâncias no discurso jesuítico (século XVII). Este estudo busca analisar os registros de milagres, selecionados em documentação jesuítica, a partir de elementos discursivos que viabilizam possibilidades de questionamentos e reflexões sobre o projeto reducional na América, juntamente com o complexo fenômeno de contato cultural. O milagre apresenta-se como via de acesso para a caracterização da construção do discurso religioso, e não um fim. Nas Cartas Ânuas há a ocorrência de uma repetição nos relatos, que apesar da quantidade, constituem-se bastante semelhantes entre si. Entre 1600 e 1640, em um período de contato e primeiras consolidações reducionais, os relatos de fenômenos fantásticos constituem-se abundantes na documentação jesuítica. Estendendo a leitura dessas cartas para a segunda metade do século XVII, em um suposto período tradicionalmente definido pela estabilidade do projeto jesuítico, milagres continuam fazendo parte do discurso religioso. Portanto, cabe a questão sobre o porquê de permanecer evidenciando resultados do projeto missional e, ainda, buscando a conversão de gentios. O objetivo da pesquisa não inclui divagações sobre a natureza e empiricidade dos fenômenos milagrosos; e sim, a análise do discurso jesuítico, sendo este religioso personagem e autor do mesmo.

5.     Carla Cristina Nacke Conradi, UNIOESTE (professora doutora). A Trajetória Política dos Guarani Ñandeva no Oeste do Paraná. Esta comunicação pretende discutir o devir recente dos Guarani Ñandeva no Oeste do Paraná em decorrência da construção da Usina Hidrelétrica Itaipu Binacional. O período dos anos de 1977, início da construção da Itaipu, até 1997, quando foi demarcada a segunda reserva indígena no Oeste do Paraná. Duas questões básicas nortearam a discussão: as estratégias estatais visando desconfigurar a região enquanto um espaço indígena; e a trajetória de mobilização política dos Guarani que resultou na demarcação das duas reservas indígenas no Oeste do Paraná, Santa Rosa do Oco´y e Tekoha Añetete. Com a construção da Usina a comunidade indígena foi reconhecida oficialmente pela Funai e passou a ser tutelada por este órgão estatal. Depois de muitas negociações entre Usina, Funai e os índios, os Guarani foram assentados numa pequena área considerada imprópria para a sua organização socio-espacial. Todavia, foi nesse novo estabelecimento que eles reelaboraram suas práticas de luta e iniciaram um processo de denúncias, tanto no contexto nacional quanto internacional, sobre o descaso do Estado em relação à sua cultura e aos seus direitos. A partir desta mobilização política a recuperação de seu território tradicional (de 1500 hectares) foi possível. Conquistaram assim, o Tekoha Añetete. 

6.     César de Miranda e Lemos, UFRJ (doutorando). Fontes para um Debate: os índios na urbanidade carioca no início do oitocentos. A Comunicação objetiva apresentar os resultados de levantamentos de fontes sobre a presença indígena na cidade do Rio de Janeiro na primeira metade do século dezenove. Essas informações compõe o acervo de pesquisas que fundamentam o doutoramento que realizo na ESS/UFRJ, sob o título de "Registros de papel branco: a presença indígena, relações interétnicas e suas representações no Rio de Janeiro, do Império à República." Enfim, a comunicação pretende oferecer uma abordagem desta presença em seus mais amplos sentidos: étnico, social, simbólico e cultural. Sentidos e espaço são conectados numa perspectiva de abordagem que salienta a territorialidade política da cidade do Rio de Janeiro em tempos de forjamento de uma nação e com ela das representações de capitalidade e civilidade investidas neste espaço - território no início do oitocentos. A presença indígena nessa territorialidade é, portanto, a chave de acesso ao universo complexo de relações interétnicas e de interações societárias que forneceram oxigênio e textura ao tipo de edifício nacional desenhado na primeira metade do dezenove na Cidade-Corte-Capital do Brasil.

7.     Edson Hely Silva, UFPE e UNICAMP (doutorando). “Isso aqui é nosso! Isso é da gente!”. O Perigo Comunista e os Índios Ignorantes: a participação dos Xukuru nas Ligas Camponesas (Pesqueira, PE, 1961). A partir de registros das memórias orais indígena, jornais da época, documentação do DOPS e relatórios oficiais que alertavam a doutrinação dos índios em sua “ignorância” pelos comunistas, discutiremos a mobilização e participação dos Xukuru nas Ligas Camponesas em Pesqueira-PE, na ocupação de terras onde viviam na condição de moradores e trabalhadores assalariados, os chamados “caboclos” da Serra do Ororubá, um antigo aldeamento indígena invadido pelos latifundiários.

8.     Eduardo Natalino dos Santos, USP (professor doutor). Fontes Nativas Pré-Hispânicas e Coloniais da Mesoamérica e Andes: principais conjuntos e problemas de entendimento e interpretação. Grandes conjuntos de vestígios arqueológicos e de fontes figurativas e escritas, produzidos pelas populações nativas tanto na época pré-hispânica quanto após o contato, procedem da Mesoamérica e dos Andes. Entender e interpretar esses vestígios e fontes com base em procedimentos e teorias relacionados às Ciências Humanas, sobretudo à História, Arqueologia e Antropologia, tem sido uma tarefa feita e refeita desde o século XIX. Nesta comunicação, apresentarei as características de alguns dos principais conjuntos de fontes figurativas e escritas provenientes dessas duas macro-regiões, bem como os principais problemas relacionados ao seu entendimento e as grandes linhas interpretativas que têm marcado seus estudos. Por fim, procurarei mostrar que os trabalhos interdisciplinares realizados nas últimas três ou quatro décadas – principalmente por historiadores, antropólogos e arqueólogos, mas também por estudiosos de outras áreas – têm se mostrado um caminho promissor para a compreensão dos múltiplos e mutáveis significados e usos que essas fontes teriam em suas sociedades de origem e, conseqüentemente, para a superação da busca de sentidos universais e imutáveis de suas imagens e textos.

9.     Elisa Frühauf Garcia, UFF (doutora). A Construção de Alianças entre os Portugueses e os Índios Missioneiros durante as Tentativas de Demarcação do Tratado de Madri. Durante as tentativas de demarcação do Tratado de Madri na região sul, o general Gomes Freire de Andrada, instruído por Sebastião José de Carvalho e Melo, desenvolveu uma política de atração da população missioneira para os domínios portugueses. Em alguns encontros com os índios durante o conflito conhecido como "guerra guaranítica" (1754-1756), assim como depois da sua entrada nos povos, Gomes Freire se valeu de todo um cerimonial característico da sociedade de Antigo Regime visando demonstrar aos missioneiros a maior "bondade" e "justiça" dos portugueses se comparados aos espanhóis. A partir, principalmente, dos relatos escritos pelos jesuítas e pelos oficiais portugueses pretende-se perceber como o general colocou em prática a sua estratégia e quais foram as respostas da população indígena, considerando-se que uma parte desta seguiu os portugueses após a sua retirada das missões.

10. Eunícia Barros Barcelos Fernandes, PUC-RJ (professora doutora). Imagens de Índios em O Malho: a imprensa como mediadora de representações. O MALHO foi uma revista publicada de 1902 a 1954 no Rio de Janeiro. Semanal, o periódico representou, junto com outros, um incremento da imprensa ilustrada na recente república brasileira. Assumiu um caráter eminentemente de crítica e sátira política, repleto de charges e caricaturas produzidas por expoentes de então como Kalixto – um de seus editores –, Pederneiras e Leônidas, sendo significativo o uso que tais artistas fizeram de figuras indígenas para expressarem seus posicionamentos diante da sociedade em que viviam. Pretende-se apresentar imagens encontradas entre 1902 e 1930, desenvolvendo reflexões sobre as mesmas e indicando um ‘lugar de fala’ para o periódico, sugerindo a mediação dele na continuidade e/ ou transformação de representações acerca dos indígenas.

11. Francieli Aparecida Marinato, UFES (mestranda). A Diretoria do Rio Doce: um projeto de pacificação dos índios Botocudos (ES, 1824-1845). A Diretoria do Rio Doce foi instalada no Espírito Santo atendendo ao Regulamento interino de 1824, a mais completa legislação indigenista do Primeiro Reinado. Seguindo o processo de colonização desencadeado no Doce desde 1800, a Diretoria tinha caráter militar e priorizava esforços para reunir os índios Botocudos em aldeamentos. Utilizando as inúmeras correspondências dos diretores com os Governos provincial e imperial, analisamos o discurso de pacificação, tão apregoado no contexto histórico em questão, e a relação desenvolvida entre índios, militares e colonos. Neste trabalho, que foi desenvolvido em nível de Mestrado na UFES, evidenciamos a falência do empreendimento colonial e da política de pacificação em função, dentre outros, da obstinada resistência dos Botocudos; e demonstramos as formas de adaptação e convivência dos grupos índígenas com a rarefeita sociedade formada no Doce espírito-santense, negociando interesses, mantendo um intenso trânsito entre as florestas, aldeamentos e povoados, e recusando a condição subalterna de integração oferecida pelo Governo.

12. Giovani José da Silva, UFMS (professor) e UFG (doutorando). Os Índios Kadiwéu na História: problematizando fontes. A comunicação tem por objetivo problematizar algumas informações freqüentemente relacionadas à constituição da Reserva Indígena Kadiwéu, localizada ao norte do município de Porto Murtinho, Estado de Mato Grosso do Sul, fronteira Brasil/Paraguai. Muito se fala, por exemplo, em uma suposta doação de terras aos Kadiwéu por parte de D. Pedro II, em reconhecimento pela participação dos índios na Guerra contra o Paraguai (1864-1870). A primeira demarcação da Reserva ocorreu entre 1899-1900 (a mando de Antônio Pedro Alves de Barros) e a última, realizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) com apoio do Exército, em meados dos anos 1980. Em relação à primeira demarcação, a documentação pesquisada revela uma outra história, diferente daquela contada por índios e repetida por pesquisadores não-indígenas. Atenção especial é dada à percepção e ao entendimento de como os próprios indígenas Kadiwéu, ao longo do século XX, elaboraram internamente a delimitação de um espaço físico para viverem e quais estratégias adotadas pelo grupo lhes garantiram a sobrevivência física e cultural até os dias atuais. Nesta elaboração estão presentes importantes elementos na construção do território para os indígenas, tais como a memória social e a identidade étnica, analisadas em perspectiva histórica.

13. Guilherme Galhegos Felippe, PUC-RS (mestrando). A Confissão Cristã e sua Assimilação Indígena nas Reduções Platinas. Antes de instalarem as primeiras reduções na região platina, os jesuítas já procuravam difundir a fé cristã em suas missões itinerantes catequizando e batizando os nativos. Frente às inúmeras dificuldades surgidas, iniciou-se a instalação das reduções jesuíticas que teriam o objetivo de abrigar, proteger e facilitar o acesso indígena ao conhecimento católico. Desta forma, sacramentos como a confissão teriam mais facilidade para serem implantados no meio reducional. Analisando-se a correspondência jesuítica escrita entre os anos de 1609 a 1640 observa-se um fato peculiar: existe uma grande incidência de relatos envolvendo a confissão sacramental, porém apenas uma minoria deles comprovam a eficácia da realização do sacramento. O presente estudo tentará compreender o que provoca esta desigualdade no discurso jesuítico registrado.

14. Iára Quelho de Castro, UFMS (professora). Relatos sobre os Guaná-Kinikinau: uma nova história indígena sob antigas fontes. Opção analítica adotada especialmente a partir dos anos de 1980, a busca do olhar indígena nas fontes escritas tornou-se uma via de acesso privilegiada para a construção de uma nova história indígena. Tendo por horizonte essa perspectiva de análise apresentamos uma breve reflexão sobre relatos e narrativas que registraram a presença dos Guaná-Kinikinau na região do Alto Paraguai, na área correspondente ao atual Mato Grosso do Sul, entre o final do século XVIII e as primeiras décadas do seguinte, apontando a existência de fendas na documentação que, embora carregando as marcas do seu tempo e os códigos culturais dos seus autores, permitem vislumbrar as táticas forjadas pelos indígenas na demarcação de um espaço político no interior da sociedade mais ampla da qual passaram a fazer parte.

15. Izabel Missagia de Mattos, UCG (professora doutora). Domingos Pacó e a Missão de Itambacuri. O estudo da trajetória do intérprete e professor bilíngüe do aldeamento do Itambacuri (1873-1917) Domingos Ramos Pacó, autor de uma minuciosa descrição da história e da vida social da missão indígena, revela aspectos diferenciados do destino dos índios ali aldeados. Fruto primeiro das relações de mestiçagem deliberadamente produzidas pelos diretores do mais bem estabelecido aldeamento imperial entre os regidos pelo Decreto 426 de 1845, seu registro batismal inaugura uma longa série de sacramentos realizados pelos diretores capuchinhos, sob os desígnios da romanização eclesiástica. Instruído pelos missionários, Pacó tornou-se secretário e ecônomo do aldeamento ao longo de 18 anos, sendo demitido após a revolta indígena de 1893. Deprimido, ele escreveu o manuscrito Hámbric anhamprá ti mattâ nhiñchopón? ( 1918), no qual teceu críticas severas à política dos missionários, que passou a não reconhecer a identidade indígena dos aldeados, em consonância com os interesses nacionalistas da nascente república. Os descendentes de Pacó se encontram atualmente na zona rural do município de Campanário, MG, se autodesignam Mucurim e reivindicam ao Estado reconhecimento étnico e direito à políticas públicas diferenciadas.

16. Jaci Guilherme Vieira, UFRR (professor doutor). Monges Beneditinos no Vale do Rio Branco. Este trabalho vai enfocar a vinda da ordem de São Bento para o Rio Branco, atual estado de Roraima em 1909. O objetivo é expor quais as condições que os monges Beneditinos encontraram para desenvolver um projeto de catequização entre as populações indígenas, além de mostrar, um grande projeto empreendedor dos monges e os primeiros problemas enfrentados com a elite local, em sua maioria fazendeiros de gado.

17. Jean Baptista, FURG (prof.) e PUC-RS (doutorando). Igrejas, Capelas e Opy: espaços religiosos reducionais. A religiosidade reducional, gerada no contato entre jesuítas e sul-ameríndios, ganhou espaços específicos para ser exercida nas reduções paraguaias do século XVII e XVIII. Longe de tal fato excluir outras tantas áreas do gênero, igrejas e capelas configuram-se na documentação missionária como áreas de culto reconhecido e normatizado. Por outro lado, a distribuição espacial das capelas, especialmente aquelas pertencentes a cada família extensa, aponta para a geração de espaços onde a liderança espiritual de cada cacique pode ser exercida — o Cabildo, outro importante espaço das lideranças, garantia apenas o exercício coletivo sobre o temporal. Apresenta-se, com isso, a possibilidade de religiosidades distantes das normativas da catequese, singulares conforme suas origens étnicas e/ou culturais, assim como a institucionalização estratégica de caciques-feiticeiros encabeçando grandes grupos. A garantia de êxito da conversão e, num plano geral, da ocidentalização, assim, podem ser reavaliadas mediante ações, atribuições e reflexões indígenas registradas pelos próprios missionários. Trata-se, portanto, de apresentar um debate religioso que permeou a história reducional, marcando, por extensão, a religiosidade indígena contemporânea.

18. John  Manuel Monteiro, UNICAMP (professor doutor). Tapanhunos, Caripunas e Curibocas: as relações entre ameríndios e africanos na América Portuguesa. Esta comunicação avalia contribuições recentes sobre as relações entre povos ameríndios e escravos africanos e afrodescendentes, mostrando a importância deste tema para a compreensão da história social, econômica e cultural da América Portuguesa. A pouca visibilidade do tema na historiografia se deve, em parte, à divisão de tarefas entre os cientistas sociais, circunscrevendo os índios aos estudos etnográficos e à etnologia, por um lado, e os africanos aos estudos da escravidão e das relações raciais, por outro. Novos estudos, potencializados não apenas pelo melhor acesso à documentação colonial como também pelas perspectivas analíticas que marcam os debates sobre a história indígena e sobre as comunidades quilombolas, abrem possibilidades para pesquisas futuras nesta área.

19. Jóina Freitas Borges, UFF (doutoranda). Documentos, Cacos Cerâmicos e Fragmentos de Memórias: os Tremembés descalços sobre os mosaicos de suas histórias. Os indígenas, além de todo massacre sofrido durante a época colonial, foram extintos por decretos em diversas províncias durante o império. A política imperial, e mais tarde republicana, assegurou sua transformação em “caboclos”, potencial massa trabalhadora a ser integrada na “sociedade civilizada”. No caso dos tremembés do Ceará, muitos ainda hoje recordam a época em que não podiam sequer afirmar que eram índios, ou tremembés, sob risco de perderem a própria vida. A partir da experiência de uma semana de aula entre os professores das escolas diferenciadas indígenas tremembés, quando foi apresentada a dissertação de mestrado Sob os Areais: Arqueologia, História e Memória, este trabalho procura explorar as relações entre a pesquisa em história, seu ensino, a interdisciplinaridade e a sua aplicação no cotidiano e na luta pela demarcação da terra. Uma das questões pertinentes é como o trabalho da academia é recebido pelos descendentes dos sujeitos do processo histórico em estudo. Como eles redimensionam o papel da história nas suas vidas e, no caso, como a história oral aparece como uma espécie de salvaguarda das tradições. Analisando documentos, sítios arqueológicos e as fontes orais eles assumem o compromisso, e lutam pelo direito, de ensinarem e construírem a própria história.

20. José Luiz Costa Neto, PUC-RS (mestrando). Poligamia Guarani e Metodologia Inaciana: reflexões acerca de uma fonte. Uma conhecida passagem da obra “Conquista espiritual”, do padre Antonio Ruiz de Montoya, tem sido utilizada para corroborar a tese de que a poligamia se configuraria na principal prática da cultura guarani e, portanto, no maior empecilho ao projeto reducional no período imediatamente posterior ao contato com os inacianos. O presente estudo configura-se numa crítica a essa proposta interpretativa. A partir de uma problematização distinta acerca da referida fonte, alvitra-se que tal passagem apresenta sobretudo uma metodologia inaciana que visa a cristianização dos Guarani. Essa metodologia, dando maior flexibilidade à poligamia, conduziria os Guarani reduzidos a ocultarem as demais práticas, investindo todos os seus esforços na tentativa de negociar abertamente a possibilidade de dar continuidade à poligamia. Haveria assim uma redução dialógica que muitas vezes antecederia a redução de fato. Desse modo, propõe-se que se a poligamia está no cerne das contendas entre jesuítas e ameríndios reduzidos, isto não é fruto de uma maior essencialidade dessa prática. É antes o resultado de uma metodologia inaciana – justificada e com um prazo estipulado – e da permanência oculta de antigas práticas guarani.

21. Juliana Fujimoto, USP (mestranda). A Leitura Tupinambá da Alteridade: os mitos sobre a origem dos bens culturais. Analisarei os mitos Tupinambá sobre a origem dos bens culturais presentes nos textos dos viajantes, missionários e colonizadores que vieram ao Brasil entre a segunda metade do século XVI e o final do século XVII, avaliando a influência do contato desses índios com os europeus na elaboração e re-elaboração desses mitos cujo tema traz também a visão do índio sobre as diferenças culturais entre ele e o europeu. Partirei de uma concepção de mito que tenha em conta sua historicidade: utilizarei a crítica histórica tanto para a reavaliação das minhas categorias de análise quanto para a contextualização dos meus documentos. Esta linha teórica é dada pela Escola Italiana de História das Religiões que utiliza um método histórico comparativo na análise dos fatos religiosos. Considero a situação em estudo como um fator de ordem religiosa, pois é a linguagem da religião cristã uma das mediadoras da comunicação entre missionários e indígenas, e o principal instrumento de tradução da alteridade americana para a cultura européia (POMPA, 2003). Essa adaptação da religião católica ao mundo indígena gerou mal-entendidos que resultaram em uma religião híbrida (AGNOLIN, 2006). É esse hibridismo religioso constatado por vários estudiosos em sua dimensão ritual, que pretendo verificar nesses mitos.

22. Kalna Mareto Teao, UFES (mestranda). Os Guarani Mbya: interfaces entre antropologia e história. Mesmo sendo os Guarani Mbya amplamente retratados no campo do discurso antropológico, quando se refere a construção da história do Espírito Santo, os Mbya são silenciados e tornados invisíveis na maioria dos livros didáticos regionais e também na imprensa. Dessa forma, neste trabalho, pretendemos analisar o levantamento de fontes históricas e antropológicas desde a chegada dos Mbya ao estado (1967 aos dias atuais). Ao efetuar tal análise, a relação entre História e Antropologia possibilita uma compreensão mais aprofundada acerca dos Mbya ao contribuir para o levantamento de fontes acerca desses povos indígenas. Além disso, promove a interdisciplinaridade ao fornecer, no campo teórico, conceituações fundamentais e no campo metodológico, a etnografia. A relação entre as duas áreas do conhecimento humano recupera, sobretudo, a história e o protagonismo dos povos indígenas, anteriormente silenciados nos documentos escritos oficiais. Essa interface apresenta-se como uma tentativa de inserção da história indígena no contexto da história da sociedade nacional.

23. Lígio José de Oliveira Maia, UFF (doutorando). A Construção Retórica da Edificação: Vieira, os índios e a missão nas Serras de Ibiapaba. A comunicação proposta é um exercício de reflexão histórica sobre um dos escritos mais conhecidos do Pe. Vieira: Relação da missão da Serra de Ibiapaba (1660). Paradoxalmente, “conhecido” porque sempre publicado - junto aos Sermões ou coletâneas de textos vierianos -, por outro lado, em minha opinião, ainda não estudado demoradamente. O motivo, talvez, seja porque alguns autores não conseguem encaixá-lo nos textos proféticos do autor; ou mesmo, por se referir à região do Ceará – uma das portas de entrada do imenso Maranhão -, ainda considerado pela historiografia de somenos importância no âmbito da história colonial. A Relação de Vieira é uma continuação retórica dos trabalhos missionários no (e para o) imenso Maranhão; porém, para dar conta de sua complexidade – pois não se trata da construção de um quadro objetivo da realidade colonial -, busca-se um diálogo estreito, hoje, envolvendo historiadores, antropólogos e lingüistas para compreender os limites deste discurso e a construção de seus mediadores, sobretudo, apontando o lugar do índio e do trabalho catequético neste que considero ser uma retórica de edificação, sem perder de vista o contexto conflituoso entre jesuítas e colonos, pelo uso da mão-de-obra indígena ao final da década de 1660.

24. Luisa Tombini Wittmann, UNICAMP (doutoranda). Índios e Brancos no Vale do Itajaí (1850-1926). Esta comunicação tem como objetivo apresentar a publicação integral da minha dissertação de mestrado, que discute o contato do povo indígena Xokleng com imigrantes alemães e funcionários do SPI, na região do Vale do Itajaí, no Estado de Santa Catarina (1850-1926). O livro aborda três momentos: os embates entre os nativos e os recém-chegados, as adoções de crianças indígenas e o cotidiano do Posto Indígena Duque de Caxias. Buscou-se compreender as formas de pensar e agir dos diferentes sujeitos históricos envolvidos no contato, conferindo visibilidade aos atores indígenas na História, dando voz às suas próprias interpretações e ações diante da nova realidade.

25. Marcio Marchioro, UFPR. Fontes Paroquiais e História Indígena: um estudo sobre aldeamentos paulistas (século XVIII). A intenção deste trabalho é investigar a dinâmica das famílias indígenas aldeadas em São Paulo do século XVIII e início do século XIX. Por meio, sobretudo, de registros paroquiais como listas nominativas e autos de casamento, tentaremos trazer a tona modalidades indígenas de aliança fora e dentro do aldeamento. Dando prioridade aos casamentos e as agregações de índios nos respectivos fogos das aldeias, estaremos dando alento ao diálogo entre história e antropologia. Característica sempre presente, desde os primeiros trabalhos, o diálogo entre essas duas disciplinas das humanidades, é, para a história indígena vital. Neste trabalho, então, para estudarmos as formas de aliança indígena nos aldeamentos coloniais, nos reportaremos a teoria etnológica de parentesco. Mesmo que seja somente para ressaltar as diferenças entre o contexto atual e o antigo, esse trabalho é necessário. É através dele que a devida historicidade das formas culturais indígenas será pelo menos parcialmente resgatada.

26. Maria Cristina dos Santos, PUC-RS (professora doutora). A Voz do Índio? A articulação dos mediadores entre a história contada e a história escrita. Na documentação colonial produzida por cronistas, missionários, funcionários da(s) coroa(s) para dar conta dos sucessos da conquista e evangelização dos indígenas, não raro surgem reproduções de "falas" indígenas ou de diálogos entre indígenas e ocidentais. Se por um lado a reprodução destas falas indica uma condescendência do autor do registro aos indígenas por outro indicam também os condicionantes interpostos pelos mediadores na reprodução da fala indígena e da condição destes de sujeitos ativos no processo colonial. A proposta aqui, é analisar o papel e as condições colocadas pelos mediadores enquanto hierarquizadores da condição do indígena como sujeito de "falas" e de atitudes. Para realizar esta análise serão estudados as "falas" atribuídas aos indígenas reproduzidas por diferentes mediadores culturais em diferentes momentos do processo colonial da América Platina; são eles, um conquistador do século XVI, um missionário do século XVII e um funcionário do século XVIII.

27. Maria da Glória Porto Kok, UNICAMP (Pós-Doutora). Relações Interétnicas nas Fronteiras da América Meridional. Esta comunicação pretende abordar a problemática dos confrontos e interações entre grupos indígenas e agentes da colonização ibérica que se desenharam durante a conquista do extremo oeste e do sul da América portuguesa, impulsionada pela descoberta de ouro em Cuiabá (1718) e em Goiás (1725). Ao longo do século XVIII, três grupos indígenas destacaram-se pelos conflitos renitentes contra espanhóis, portugueses, colonos e grupos nativos que colaboravam para efetivar a colonização das fronteiras entre Cuiabá e Assunção: os Kaiapó meridionais, que ocupavam do sudeste do Mato Grosso até a embocadura do Araguaia; os Mbayá-Guaicuru, distribuídos na parte meridional e central do Chaco; e os Payaguá, que dominavam os rios Paraguai e Cuiabá. Diante do contexto descontínuo e violento da história colonial, novas identidades emergiram no dinâmico processo chamado de “etnogênese” pelo historiador Jonathan Hill. Os territórios indígenas foram redefinidos de modo a significar não apenas o marco de um domínio territorial das Coroas ibéricas, mas, sobretudo, um divisor de águas entre etnias distintas, acarretando mudanças profundas tanto nas culturas nativas quanto nas européias.

28. Maria Regina Celestino de Almeida, UFF (professora doutora). Índios, Negros e Mestiços: algumas reflexões. Os processos de mestiçagem cultural e étnica nas Américas têm sido repensados à luz de novas proposições teóricas e conceituais da História e da Antropologia. A idéia de identidades plurais e de historicização das categorias raciais e étnicas, bem como dos próprios processos de mestiçagem nos permite perceber que ser índio, ser negro ou ser mestiço podem ter significados diversos conforme os tempos, os espaços e os interesses dos agentes sociais que interagem. Nesta comunicação pretende-se refletir sobre tais significados no Rio de Janeiro oitocentista, enfocando prioritariamente os índios que ainda habitavam antigas aldeias coloniais.

29. Mário Fernandes Correia Branco, UFF (doutorando). Entre a Informação e o Diálogo: a percepção jesuítica acerca da cristianização dos índígenas em dois escritos do Padre Manuel da Nóbrega. O objetivo desta comunicação é apresentar uma breve exposição sobre a 'Informação das Terras do Brasil', de 1549 e o 'Diálogo sobre a Conversão do Gentio', de 1556-57, escritos pelo padre jesuíta Manuel da Nóbrega, primeiro provincial da Companhia de Jesus em terras brasílicas Como se sabe, a correspondência jesuítica constitui um rico repositório de fontes sobre os primórdios da colonização da América Portuguesa. Entretanto, para além das informações sobre a terra e a gente dos trópicos, permite, por outro lado, o acompanhamento da gênese e desenvolvimento de novas percepções dos inacianos acerca dos brasis.

30. Marta Maria Lopes, UFMT-Rondonópolis (professora doutora). Os Grupos Indígenas na Fronteira Oeste de Mato Grosso e suas Relações com os Militares no Século XIX. O objetivo deste trabalho é compreender como se davam as relações entre os índios e os militares na fronteira oeste da Província de Mato Grosso no século XIX, 1840-1850, pois estas não se resumiram a momentos de conflito e submissão ou barreira impeditiva da penetração de paraguaios e bolivianos em território brasileiro. Os militares foram atendidos pelos indígenas em trocas/comércio, no conhecimento da região, utilização de recursos naturais, no fornecimento de alimentos, cavalos, panos, etc. Os indígenas atuaram nas milícias, receberam patentes, como se pode constatar, nesse período bem anterior à Guerra com o Paraguai.

31. Ninarosa Mozzato da Silva Manfroi, UFSC (mestranda). A Questão Indígena nas Páginas dos Jornais sob a Ótica do Jurista Antonio Selistre de Campos, 1940-1950. Com base em periódicos, especialmente o Jornal “A Voz de Chapecó”, pretende-se abordar a questão indígena e suas repercussões a partir dos relatos jornalísticos do jurista Antonio Selistre de Campos. Nascido em Santo Antonio da Patrulha – RS, formou-se em Direito em Porto Alegre – RS e a partir de 1931, já nomeado Juiz de Direito, optou morar definitivamente em Chapecó – SC, após passar por outras localidades do mesmo Estado. Como um dos fundadores do jornal “A Voz de Chapecó”, Antonio Selistre de Campos trazia à comunidade local a situação dos indígenas da região, os Kaingáng, abordando questões sobre a saúde, educação e terra.

32. Paulo Henrique Marques de Q. Guedes, UFPB (professor). A Colonização do Sertão da Paraíba: agentes produtores do espaço e contatos interétnicos (1650-1750). O presente trabalho é resultado de minha dissertação de mestrado defendida em 2006 no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba e tem como objetivo principal analisar a ocupação colonial do sertão da Paraíba tomando por base os agentes produtores deste espaço e os contatos interétnicos, realizados entre índios e colonizadores, num período que compreende a segunda metade do século XVII e as três primeiras décadas do século XVIII. Assim, nosso principal problema foi avaliar a atuação social de colonizadores e índios na reorganização do espaço-sertão em meio a sua colonização.

33. Raimundo Nonato Gomes dos Santos, UFRR (professor). Luta para Encontrar o Rumo Certo: lideranças indígenas em Roraima (1978-1990). Tomando como fonte documental as atas das assembléias de tuxauas realizadas entre os anos de 1978 e 1990, o presente artigo reflete sobre as representações elaboradas nesse material pelas lideranças indígenas em Roraima, que se consolidaram na construção de um movimento político desses povos. Este ensaio investiga, nos discursos registrados, as propostas que orientaram a construção de uma nova identidade indígena, bem como as características de suas lideranças.

34. Ricardo Pinto de Medeiros, UFPE e UFPB (professor doutor). Participação, Conflito e Negociação: principais e capitães-mores índios na implantação da política pombalina em Pernambuco e Capitanias Anexas. O presente trabalho pretende, a partir de fontes manuscritas e à luz de estudos recentes sobre a política indigenista do período pombalino, analisar o papel que os principais indígenas tiveram no processo de implantação das modificações advindas com implantação do Diretório e de sua versão local, a “Direção” para Pernambuco e suas capitanias anexas. Além disso, problematiza a importância que os capitães e sargentos-mores índios tiveram no processo de prisão, repressão, transferência e redução em vilas dos índios aldeados e dispersos do sertão.

35. Silvana Alves de Godoy, UNIABEU (professora). A Vila de Itu e os Negros da Terra – séculos XVII e XVIII. Os estudos que abordam a capitania paulista, tradicionalmente, enfatizaram o período bandeirante (século XVII) e cafeeiro (século XIX). Em geral, considera-se que o final do século XVII e início do XVIII - tempo das descobertas do ouro, seria um período de rupturas em relação ao século XVII. Atualmente a historiografia destaca que, para além deste viés de ruptura, o século XVIII foi caracterizado também pela continuidade em relação ao século anterior. Ao recuar no tempo para buscar respostas para o processo de formação da vila de Itu, observa-se que a descoberta do ouro não significou necessariamente o fim do apresamento de índios, ainda que a escala tenha sido vertiginosamente menor do que a verificada no século XVII. Portanto, o que se percebe é um redirecionamento das atividades a partir das possibilidades que a descoberta do ouro trouxeram, mas ainda calcadas na mão-de-obra indígena. Com ela, desenvolveu-se uma estrutura agrária voltada para a produção de mantimentos e a proliferação de ofícios que deram suporte às expedições monçoeiras. A partir do cruzamento de informações obtidas em fontes como testamentos, inventários, cronistas, ordenanças e de pagamentos de donativos reais analisaremos a presença de indígenas na vila de Itu no final do século XVII e inícios do XVIII.

36. Silvana Cassab Jeha, PUC-RJ (doutoranda). O Padre, o Militar e os Índios: Chagas Lima e Guido Marlière, civilizadores de kaingangs e botocudos nos sertões de Minas Gerais e São Paulo, século XIX. Esta dissertação defendida na UFF em 2005 é uma pesquisa sobre a atuação, na primeira metade do século XIX, de dois agentes indigenistas. O primeiro é o padre curitibano Francisco das Chagas Lima, responsável pela catequese e civilização dos índios durante a Real Expedição de Guarapuava, região localizada à época na Província de São Paulo. O segundo é Guido Thomaz Marlière, militar de origem francesa, diretor-geral de índios de Minas Gerais e comandante-geral das Divisões do Rio Doce. Após uma breve exposição dos debates indigenistas na Corte, são analisados os discursos e as narrativas de Marlière e Chagas Lima sobre as relações sociais nas duas frentes de expansão. Além disso, este trabalho propõe-se a editar as informações etnográficas sobre botocudos e kaingangs produzidas por esses autores colocá-las numa perspectiva comparativa com outras etnografias e etnologias, a fim de interpretar as ações dos índios diante da colonização. Trata-se enfim, de um estudo de história com incursões pela antropologia.

37. Teresinha Marcis, UESC (professora). O Cotidiano das Famílias Indígenas da Comarca de São Jorge dos Ilhéus através dos Documentos, 1758-1820. O período histórico marcado pela implantação das reformas do Marques de Pombal favoreceu a produção de informações importantes sobre vários aspectos geográficos, sociais, econômicos e políticos da Colônia, aqui destacando a área que compreendia a antiga capitania de São Jorge dos Ilhéus, então Comarca. No que se refere aos índios habitantes desse espaço, vistos como potenciais súditos, além de serem citados nos relatórios gerais a cerca dos recursos naturais e humanos da Comarca de Ilhéus, foram feitos recenseamentos e outros levantamentos específicos, principalmente sobre os antigos aldeamentos elevados a condição de vilas. A grande parte desses documentos já se encontra publicada e subsidiando produções de conhecimentos importantes e, nesse conjunto, esse trabalho pretende ampliar a leitura e análise enriquecendo com novas fontes primárias e abordagens, buscando perceber o cotidiano das famílias indígenas comuns ao focalizar os papéis sócio-econômicos dos homens e mulheres das vilas de Barcelos, Santarém e Olivença no período entre 1758 a 1820.

38. Vânia Maria Losada Moreira, UFFRJ (professora doutora). Entre Índios e Negros do Mato: antinomias da construção da ordem nos sertões do Espírito Santo durante o século XIX. Nas últimas décadas, os avanços dos estudos históricos sobre índios e quilombolas foram notáveis. Apesar disso, ainda sabemos pouco, principalmente sobre as possíveis interconexões entre ambos nas diferentes temporalidades e nos variados sertões do Brasil. Na presente comunicação, discutiremos as potencialidades da documentação existente no acervo do Arquivo Público do Estado do Espírito Santo no sentido de recuperar a história e a dinâmica étnico-social dos sertões e zonas de contato daquela região durante os oitocentos. Lá se reuniam, em um mesmo tempo e lugar, dois temidos "inimigos internos" da sociedade dominante em expansão do século XIX: os "ferozes Botocudos" e os "quilombolas criminosos". Na análise documental, destacaremos a presença de índios, quilombolas, escravos e autoridades locais e as relações interétnicas criadas nas zonas de contato durante o processo de construção da chamada "ordem" ou "segurança pública". Procuraremos demonstrar que aqueles sertões, então vistos pelo sistema dominante como refúgio de índios, renegados e criminosos, foi também palco de surpreendentes relações interétnicas, como a união entre senhores e escravos contra os "bárbaros" da terra, mesmo em meio à crise do sistema escravista e à intensificação das fugas e da formação de quilombos.

39. Vera Chacham, UFMG (professora doutora). A História na Fonte: cenas, detalhes e ruínas dos povos indígenas em narrativas de viagem de Saint-Hilaire ao Brasil. Para Saint-Hilaire, “As viagens são uma das fontes da história.” A frase, extraída por ele de Viagem à América, de Chateaubriand, é um argumento e uma idéia recorrentes nas narrativas que o naturalista escreveu sobre o Brasil. Consciente de ser testemunho histórico para o futuro, e de que “nossa civilização é toda baseada na idéia de futuro”, Saint-Hilaire parece ter sua imaginação voltada para o tempo enquanto percorre o espaço. E, assim como o futuro está “presente” nas suas considerações sobre as regiões que descreve, também o passado encontra-se ali, não somente enquanto vestígio de transformações na paisagem, mas como uma forma de compreender conflitos entre brancos e índios, e sobretudo a situação de decadência em que se encontravam estes últimos. Ainda que de forma fragmentária, o viajante procura contar uma história que seja capaz de fazer perceber que tais ruínas, estes restos de povos, que seriam os índios, revelam-se, segundo ele, “cousas interessantes”, à medida que procuramos saber “a que edifício pertencem e que mãos bárbaras vieram demoli-lo”. Minha proposta, assim, é lermos a narrativa de viagem de Auguste de Saint-Hilaire como historiografia, como uma espécie de escrita da história.

40. Vera Lúcia Ferreira Vargas, UCDB/NEPPI (professora). Os Terena no Sul de Mato Grosso: a conquista de seu território. Este trabalho tem por objetivo apontar algumas das ações que os índios Terena tiveram junto ao governo brasileiro, para garantir a posse de seu território no final do século XIX. Para isso, estabeleceram uma suposta relação de amizade com as autoridades brasileiras. Realizando certas tarefas, como a de ajudar na catequese das demais etnias indígenas, dentre outras ações exercidas pelos Terena, que por sua vez, permitiram a eles estabelecer acordos de troca de favores com o Império.