Nota de repúdio à intervenção do MEC no vestibular da Universidade da Integração da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) para pessoas trans e travestis

Data da publicação: ter, 18/02/2020 - 13h49min

A Congregação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, em sua 247ª Sessão Ordinária, realizada aos 07 de agosto de 2019, repudia a intervenção do governo Bolsonaro no vestibular da Unilab, reiterando nossa defesa da autonomia universitária e reconhecendo a importância das políticas de reparação para a população LGBT.

Uma semana após o lançamento do edital de vestibular específico da Unilab (Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira), que reservava 120 vagas ociosas em três campi diferentes para pessoas transsexuais, travestis, interssexuais e não-binárias, Bolsonaro anunciou, em sua conta pessoal do Twitter, uma intervenção do MEC na universidade. A medida tomada pelo Ministério da Educação foi de suspensão deste vestibular e, por consequência, a interdição a uma política de acesso e inclusão ao ensino superior e de reparação histórica à violência estrutural que vivencia cotidianamente essa população. Sob a alegação de que a Lei das Cotas não se estende ao grupo de pessoas em questão, o governo põe em xeque a autonomia e o direito das universidades de debater e decidir sobre seus próprios mecanismos de acesso e evidencia o descaso com a luta e as pautas das pessoas trans.

Essa medida vai ao encontro de outras movimentações do governo Bolsonaro. Logo no início do ano, a população LGBT foi retirada das diretrizes de Direitos Humanos e a criminalização da homofobia e da transfobia no STF foi definida pelo presidente como “completamente equivocada”. Ao invés de promover políticas públicas que visam incluir os setores mais marginalizados da sociedade, Bolsonaro opta por desmontar as conquistas do movimento LGBT. A intervenção do MEC na Unilab é mais um elemento deste desmonte, além de não considerar a trajetória das pessoas transsexuais, travestis, interssexuais e não-binárias no sistema de ensino e os diversos obstáculos enfrentados por elas.

Destacamos a importância de debater e implementar políticas de ação afirmativa para a população frente ao preconceito e à violência sofrida por essa população, que leva a expulsão de diversos jovens trans para fora das escolas e aprofunda a evasão escolar. No ensino superior, de acordo com uma pesquisa divulgada neste ano pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), apenas 0,2% dos estudantes de graduação de universidades federais são transgênero. Foi diante deste drástico cenário que diversas universidades, como a UFABC, a UFRJ, a UNEB e a UFBA, adotaram programas de reserva de vagas para as pessoas transsexuais, travestis, interssexuais e não-binárias. A suspensão do vestibular específico da Unilab, no entanto, vai na contra-mão deste importante debate. Em resposta à intervenção do MEC, os estudantes ocuparam o Campus da Liberdade, no interior do Ceará, em defesa da autonomia universitária e exigindo a publicação de um novo edital de reserva de vagas. A Congregação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, reunida no dia 07 de agosto de 2019, presta total solidariedade à luta dos estudantes da Unilab e às políticas de acesso e inclusão de pessoas transsexuais, travestis, interssexuais e não-binárias no ensino superior. Repudiamos a intervenção do Ministério da Educação no vestibular e defendemos intransigentemente a autonomia universitária.

Congregação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas

07 de agosto de 2019